quarta-feira, 31 de julho de 2013

Resquícios



A gente levanta da cama - diga-se, com sacrifício sobre-humano  - todas as manhãs e escolhe a máscara do I-don't-care-anymore. De tanto ser usada ela encaixa perfeitamente, sem folgas. Saímos com ela e quem vê até acredita - às vezes até o espelho.

E então durante o dia, uma imagem furtiva, uma palavra que escapa, um certo sei-lá-o-que no ar, e a máscara derrete em segundos, revelando a verdadeira cara patética que teima em olhar para trás.

Essas são as horas de fechar a porta e ir embora, thousand miles away, ou mais, mais, mais, mas para que direção se vai quando arrastamos uma alma que teima em carregar âncoras, grilhões, memórias... Para onde?

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Let me go



Nem que eu viva cem anos não vou entender como funcionam determinadas mentes humanas.

Por que o que sai pela boca é o contrário do que mostram as atitudes, as contas telefônicas e as caras feias?

O que aconteceu com o "nunca mais", com o "não mais", com o "fim", com o "cansei"? Mudaram de significado na reforma ortográfica e não me avisaram?

Eu juro que ouvi tocar a música de adeus, eu juro que chorei as derradeiras lágrimas, eu juro que o ponto final foi colocado.

Então o que acontece cara pálida? Não viu o aviso de interditado na porta?

segunda-feira, 15 de julho de 2013

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Por fim, enfim, finalmente. Até que enfim definitivamente. Que sejam brandos os amanhãs.

domingo, 14 de julho de 2013

Let go



Vamos vivendo nossas vidas com o coração cansado, nos acostumamos com as adagas sendo estocadas uma a uma, e vamos nos ajeitando na cadeira, olhando para o outro lado, recolhendo o sangue metafórico em um reservatório que parece não ter fim.

Mas tem.

Quando a última adaga é espetada o reservatório transborda e sangramos. E é uma sensação muito diferente, pois a cadeira parece não oferecer mais nenhuma posição confortável, não há mais nenhum lado para olhar que não seja o de dentro, e não há mais espaço para mais sangue. Há quem chegue ao transbordamento logo, o que é o melhor que pode acontecer, arrastar o que não se move mais é cansativo, inútil e doloroso. Carregar o peso morto por tanto tempo, no entanto, nos anestesia tanto que quando chega o momento final e de onde não há mais retorno, vem o susto. Na verdade é um susto bem pouco assustador, uma vez que já era previsível. Eu por exemplo tenho um talento nato para me recusar a enxergar o que é a própria definição de visão em si. Aliado a uma dose de teimosia e incapacidade de decisão rápida, isso me trouxe cicatrizes de adagas em excesso. Sim, porque agora tenho que tirá-las todas, e depois de inúmeras, infinitas e patéticas tentativas, sempre sobrava uma.



Não desta vez.

A rebeldia às vezes é muito sem graça quando acaba se voltando contra nós mesmos, e não parar quando já passou da hora é burrice inadmissível. Eu em geral me orgulho de ter cérebro, porém ele não funciona para determinados assuntos. Para esses temos que decretar morte cerebral e desligar os aparelhos. Eu venho me sabotando há tempo demais, deixando sempre uma luzinha acesa,"esquecendo" sempre de tirar um plugue da tomada. Desta vez estou provocando o curto-circuito total.

Eu nunca quis o mais ou menos. Passei anos para descobrir que era o mais ou menos que tinha e tratei logo de tomar as providências cabíveis, já fui mais esperta. No entanto a área obscura do cérebro acabou por se manifestar de novo, mas isso era de se esperar de quem tem um coração cheio de adagas - diga-se, por escolha própria, posso ser teimosa mas ainda assumo a responsabilidade do que me acontece.

Não posso apontar dedos, tudo que vivi foi por minha equivocada escolha e estúpida insistência. Tudo muda, sim, até as pessoas, o que não quer dizer que seja para melhor. Eu vi, assisti, vivi as mudanças que queria, e o resultado foi que elas não adiantaram nada, não mudaram nada, só perpetuaram a dor que me auto-infligi por medo, por teimosia, por orgulho, por alguma coisa que em algum momento eu pensei ser amor, mas hoje já não sei mais.

O mundo anda tão tenebroso que cheguei a considerar o mais ou menos de novo. O medo da solidão, o medo do arrependimento, o medo da perda, o medo, o medo, o medo. Mas não há o que justifique o mais ou menos. Tantas, tantas pessoas me disseram que o mais ou menos é a regra, não se vive de fogos de artifício e arrebatamento para sempre. Sossega. E eu quase sosseguei, fui lá mesmo pagar pra ver. E custou caro, daí tomei as proviências cabíveis de novo.

Então, por que, oh deuses e deusas, volto e volto atrás over and over again? É como diz meu cardiologista - você tem preguiça de se exercitar, está esperando o quê? Ter um infarto? Parece que estou esperando o transbordamento do meu coração cheio de adagas, porque elas não param de chegar. E tudo o que eu tenho a fazer é levantar da cadeira onde estou no alvo e sair andando, sem olhar para trás. Mas eu saio andando e olho para trás. E agora não dá mais para virar a cabeça, agora tenho um torcicolo metafórico de quem se deu conta de tanta bobagem acumulada.

É que eu sei que deixar ir é fácil, difícil é não deixar voltar. É a fórmula que preciso descobrir. Só que entendi que algumas coisas podem - e vão - continuar morando dentro de nós, o que não significa que têm que fazer parte do que está fora. Posso jogar no armário com todos os outros esqueletos e deixar lá. E me permitir às vezes abrir o armário, mas só quando não doer mais.

Que venha o luto, passamos por tantos em nossas vidas, eu já tive meu ensaio de luto incontáveis vezes, desta vez o morto parece não se mexer mais, ficou mais ou menos. E eu tenho que ir, ainda que seja em direção ao nada.