segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

De nihilo nihil.


As malas ainda estão largadas, a casa não se limpa sozinha, os livros continuam com as palavras ordenadas na mesma maneira esperando serem decifradas, o mundo continua disponível para o que quer que seja.

Mas eu não quero. Não quero arrumar, nem procurar alguém que limpe. Não quero comer, ler, terminar de assistir o filme que foi interrompido perto do fim. Às vezes precisa-se chegar ao fim do fim para interromper. Ou findar, porque de interromper e retomar chega.

As coisas óbvias gritantes e ululantes em algum momento cessam de ser, porque não há mais razão para tanta clareza, só não vê quem não quer, e em algum momento têm-se que querer, querendo ou não.

Hoje eu declaro o dia fora de mim, não é mais luto porque isso já passou, não é mais lamento porque também já esgotou, não é mais nada, e por nada mais ser, é preciso que se deixe, paradoxalmente, o nada se manifestar.

Apesar de nada, é um nada espalhafatoso. Mas já aprendi a domá-lo e ignorá-lo. E que assim seja e continue sendo, por mais ausente de mim que isso me torne.

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Três.



Tomar posse de si mesmo. Seja lá por que meios. Rompendo quais tabus. Superando quais obstáculos. Quanto mais me aposso de mim mesma mais a vida se revela válida, justificada e mais dela me aproprio. Todo caminho é válido, especialmente se não tiver sido trilhado antes. Cheers.

sábado, 18 de janeiro de 2014

Tem mesmo "It had to be you"?


Há muito tempo ela não se aventurava mais por aquelas paragens. Era como entrar em um mundo paralelo onde de repente era agora, e só agora, não tinha ontem, amanhã ou o dia cheio de tarefas e as questões existenciais, só tinha mesmo agora.

Por motivos que não se sabe e nem nunca se saberá algo, alguém, o destino ou o acaso a atraiu de novo para o mesmo lugar, quem diria, depois de tanto tempo.

A casa semi-vazia, de mudanças, mas cheia de mágoas, tristezas e amargura, que não pertenciam a ela, mas a comoviam como se.

Ele cheio de músculos mas com cara de gatinho abandonado, primeiro a alegria genuína de rever, depois a familiaridade, depois o desabafo e a falta, a ausência total de perspectiva, o terror, a lágrima de pura solidariedade inútil, o desespero frente ao mundo, como é bom poder falar.

Mas então a casa que já teve tantas outras coisas de repente volta a ser o que foi da primeira vez, as velas se acendem, as luzes se apagam, o copo traz surpresas que só se encontram ali, o jazz enche o ar, as palavras rareiam.

E por puro agora, por puro sentimento puro, uma ligação tão forte que se continuasse explodiria a si mesma, silêncio e sussurro, quem diria, ainda pode ser melhor do que já foi um dia.

Ele assume o papel de gato que ronrona, tão só no mundo, tão desamparado, no meio daquela casa enorme, cheia de pedaços de si mesmo, ela estende a mão e só o toque muda tudo para o somente agora, somente agora, a luz das velas, o cheiro de maçã verde no prosecco, somente agora, a música - It had to be you. Somente agora. Não há injustiça, não há fim do mundo, não há mágoa, rancor, arrependimento, não há mundo lá fora, só a brisa que entra pela janela e abraça o abraço do somente agora.

Esse é o lugar onde acontece o milagre do somente agora. Ela foge, sob protestos, mas com a premência de quem ainda precisa descobrir se "o que é pra ser" será ou não. E a resposta não está no lugar onde só tem agora.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

O meio da noite - ou - não tente fazer isso em casa


Como se já fosse fácil à luz do dia, acorda-se ainda no meio da madrugada. Tudo na calada da noite tem proporções deformadas, é a hora de entrar na twilight zone, a hora dos monstros saírem do sótão, a hora das mensagens, telefonemas e posts errados. Mas é a hora poderosa em que tudo tem vida própria, não queremos, sabemos que não deveríamos, mas fazemos. Ou as coisas se fazem sozinhas, é o que parece. É quando nossa sombra mais se sente à vontade para sair, afinal, está escuro, ela nem está lá, para todos os efeitos.

As coisas findas agonizam para encerrar de vez, e o processo de assassinato lento por vezes dói mais no assassino que na vítima. É nessas horas vazias que nos ocorrem as obviedades ridículas, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa; tudo passa; amanhã é outro dia (não podia ser o mesmo anyway); foi feito o que tinha que ser feito e a melhor: as coisas são o que são.

Rolar no travesseiro com esse monte de besteira na cabeça não pode ser saudável, então a tecnologia facilita para que fique pior - por que não um sms ou um e-mail no meio da noite? por que não engolir fogo? que tal enfiar uns palitos embaixo das unhas? E a pobre mente racional se debate, grita, reclama, e por fim põe a mão na cara e diz fuck, porque não adianta mesmo, já foi, o enter já foi apertado.

Eu vou me-auto-consolando-a-mim-mesma (licença poética das 3 da madrugada com olhos esbugalhados) me dizendo que isso é assim mesmo, e vou ignorando o silencioso brado que pode - como não - estar insinuando arrependimento. Mas como sou espetacular e bem-resolvida nem dou bola. Volto ao travesseiro e choro, só um pouco, mas muito amargo, esperando que à luz do dia tudo isso não passe de um amontoado de besteira, quem sabe nem aconteceu.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Caminhos



Tanta coisa poderia ter sido. De repente no meio da manhã me assalta o "e se". E vejo atrás de mim um labirinto de caminhos não percorridos. Aqueles que comecei a percorrer e mudei de rumo, os que têm minhas pegadas à beira sem coragem de mexer o primeiro pé, aqueles que fatalmente deram no abismo, com o salto calculado e os prejuízos contabilizados. E o eterno labirinto, de onde parece que consegui finalmente sair, matando, esfacelando, cortando a sangue frio e sem piedade as pontes e selando a entrada com sangue e lágrimas, mágoas, arrependimentos e dores.

Eu estive em latitudes e longitudes que poderiam ter sido outras, outros climas, outras paisagens, outros objetivos. Mas não foram. Naquele momento foram minhas escolhas, nunca se sabe se as fazemos conscientemente ou se alguma mão nos guia ou nos tira do caminho, essa mão retórica que é a nossa mesmo, a que se insinua de dentro do sótão onde guardamos nossos fantasmas.

Se eu tivesse feito isso, aquilo não teria sido aquilo, mas sim aquilo outro, e hoje eu poderia estar assim ou assado, em tal ou tal lugar, com ou sem vários vocês. Mas não foi, as coisas são o que são, foram paridas de acordo com o que eu gerei, nutri e gestei, e agora aqui está o resultado, que não para nunca de ser parido.

O caminho em que escolhi ficar tem sido árduo, cheio de pedregulhos, acabei de voltar a ele depois de uma longa caminhada pulando entre ele e outro, uma canseira sem fim que só podia terminar em um deles dando no abismo. Mas este que permaneceu não é menos espinhoso, de tanto ser pisado e repisado e pulado em cima ficou árido, ressentido, tem flores pisoteadas atrás de mim, as que vêm parecem ter medo de florescer. Já choveu torrencialmente, chuva vinda dos meus olhos, já teve sol, hoje a estrada parece se abrir em infinitas estradinhas partes do mesmo caminho que enfim escolhi. Só me resta ir arriscando para ver aonde vão dar. De qualquer maneira, não sei qual é a certa, porque não sei bem aonde quero chegar, talvez todas levem ao mesmo lugar.