terça-feira, 20 de dezembro de 2011

As paralelas podem se cruzar no infinito


A gente pede tanta coisa. Alguns pedem aos seus deuses, outros a nem sabem quem, outros ao Universo, mas não importa, a gente está sempre pedindo. E já se sabe que é preciso cuidado com o que se pede. Mas me ocorreu que quando pedimos, escolhemos. São tantos os caminhos, quando finalmente aquele que queríamos se abre, muitos outros ficam para trás. Alguns com desmoronamentos que vão bloqueá-los para sempre, esses em geral são penosos, cai pedra por pedra em cima da gente, e sair deles dói muito.

Outros, porém, não são assim. Simplesmente eles ficam lá. São os caminhos suaves que deixamos para trás, as outras opções das nossas escolhas que não foram as eleitas - ou as que a vida não quis nos dar. Ontem eu deixei para trás um caminho suave. É tão emocionante poder falar sem subterfúgio, ter ouvidos abertos e compreensivos, é tão bom poder se mostrar sem medo. Eu estou partindo para o meu novo caminho, mas esse outro foi tão suave e tão florido que eu achei que até passaria por ele mais uma vez antes de tomar o outro. Não passei. Mas passei ao largo e foi ainda melhor. E ainda tive duas surpresas, uma que as palavras não ditas em muito tempo acabaram saindo, e outra - vejam só - apesar de eu achar que esse caminho não dava em lugar nenhum, ficou claro que avenidas poderiam se abrir. Mas tem a vida, né? Esse caminho deixei para trás florido, aberto e ensolarado. Foi uma sensação maravilhosa de humanidade.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011


Hoje o mundo acordou contra mim. Há dias em que no meio da tarde a gente conclui que não deveria ter saído da cama, pra começar. E não são acontecimentos aleatórios relacionados a Murphy, não. Esses não me pegam porque eu os ignoro.

Eu me pergunto como é que eu ainda não fui banida da sociedade civilizada. Sim, porque existem regras. E grande parte delas eu cumpro, trabalho honestamente, pago meus impostos, não cometi nenhum crime, só consumo drogas lícitas e sou razoavelmente aceitável socialmente. Só que tem as outras regras. As sub-reptícias (amo essa palavra, mas ela me parece uma cobra pronta para dar o bote) são as que estão me cutucando.

Quando eu era bem mais jovem, muitas dessas entraram na minha cabeça por osmose, e eu demorei tanto para perceber que elas não eram minhas que passei por muito sofrimento que poderia ter sido evitado. Hoje eu sei quais são as minhas e quais das dos outros eu posso acatar para ter menos trabalho - sim, porque há batalhas que também não quero mais lutar, tenho mais o que fazer.

E então, eu vou seguindo a minha vida razoavelmente aceitável socialmente quando de repente resolvo tomar uma decisão. Ocorre que ninguém me pergunta se eu vou bem, se preciso de auxílio para pagar as contas, se preciso de alguém para me abanar enquanto como uvas (sim, parece que é isso que eu faço), enfim, enquanto eu estou comportada dentro dos parâmetros aceitáveis (estabelecidos por quem mesmo? aceitáveis para quem mesmo?) tudo vai muito bem e eu sou uma boa cidadã, boa mãe, boa filha, boa amiga, enfim, um primor. Mas aí a decisão. Como assim? Então de repente a total falta de interesse vira uma enxurrada de palpites, dedos apontados, julgamentos, pré-conceitos (assim mesmo separado, pra mim faz mais sentido), e perguntas que começam com "mas e se" "mas e como", "mas por que" "mas para que". Essas são as que eu ouço. Porque existe o burburinho silencioso que grita tão alto apesar de não ter som.

Ocorre que para chegar até aqui muito me custou. Sangue, suor, lágrimas, arrastar de correntes e ranger de dentes. E - surpresa - nós somos sozinhos. Nossas dores são nossas, só nossas. Nascemos sozinhos, vamos morrer sozinhos e passamos a vida sozinhos, porque dentro da cabeça, só nós mesmos. As pessoas que mais nos amam são as que mais nos magoam, as que mais se sentem no direito de decidir o que é melhor para nós, e em geral nossa vontade não conta. E se não for conveniente para o bem-estar geral da nação, fazem até questão de torcer contra.

Junte-se a isso uma tendência suicida que eu tenho de auto-sabotagem. As palavras vão saindo da minha boca e eu sei que elas deviam ficar lá dentro mas não deixo. No meio da frase já estou arrependida, mas ainda assim termino. Não sei se consigo acabar com isso antes que isso acabe comigo. Nota-se, portanto, que de inimigos não preciso, pois os que me amam me criticam e minha maior adversária sou eu mesma.

Portanto, eu me outorgo o direito de decidir o que eu quiser,  atinja a quem atingir, doa a quem doer, incomode a quem incomodar. Não vai ser a uma altura dessas que eu vou querer começar a ser boazinha. E depois a gente não sabe porque um dia acorda, se olha no espelho e se sente a pessoa mais amarga do planeta.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Homero, Achilles e o que se passa pela minha cabeça

Eu ando me atracando com a Ilíada e como todo o resto das coisas na minha vida, tem sido intenso.

Não sei como se pode ter dúvida de que uma pessoa só escreveu a história toda, eu diria que seria simplesmente impossível ser uma colcha de retalhos de bardos como alguns defendem. Eu duvidaria que foi um ser humano que escreveu, se já não tivesse lido tantas coisas tão brilhantes quanto escritas por outros humanos (quem sabe abduzidos).

A riqueza de detalhes e a absoluta necessidade de descrever a descendência pelo menos parcial de quem está no meio da batalha com o escudo na mão ou a lança de bronze no flanco é o que me espanta. Naturalmente poderíamos discutir aqui o aspecto de análise literária, o kleos, a busca da notoriedade que demanda saber a origem e a prioridade máxima da vida o reconhecimento. Tanto que Achilles opta pela vida curta e gloriosa ao invés da chatice aos pés de Peleu. Mas não vou me alongar porque não quero analisar nada literariamenter, só quero acrescentar algumas bobagens que me passam pela cabeça.

Primeiro que só tenho tempo para ler antes de dormir e agora que cheguei na parte em que Achilles parou de bobeira e entrou na luta, eu participo da batalha a noite toda e já sei que não está custando nada para começar a fazer associações eróticas com o Achilles. Mas isso é outra história, o que é fascinante é como existem pessoas que não gostam de ler, não sabem o que é livro de verdade, os ácaros que têm dentro do cérebro têm alergia aos livros.

Obviamente a uma altura dessas da vida e tendo a formação que tive já li livros até demais. Mas a cada um é um entusiasmo que chega a ser fisicamente manifestável. As epopéias (não, não vou abolir o acento) então, são coisas tão grandiosas que é impossível não entrar nelas. Eu estou do lado dos aqueus, provavelmente pela minha quase obsessão pelo Achilles, mas o Páris me intriga. Ele é a causa de toda a confusão e em vez de lutar vai ficar com a Helena que foi pra isso mesmo que ele arrumou toda a encrenca. Eu admiro a cara de pau dele, o anti-herói que -"couldn't care less".

Não resisti a ler alguns materiais a respeito, principalmente em relação à participação dos deuses, o Olimpo não poderia ser uma baderna maior, e eu queria saber como seria se nós não tivéssemos caído no monoteísmo, como seria atualmente lidar com deuses com características mais que humanas, teimosos, rebeldes, e podendo fazer o que querem? Eu me divirto muito fazendo associações de pessoas que conheço aos deuses mais diversos, afinal o propósito todo do arquétipo é esse - encaixar alguma coisa ou alguém nele.

Homero se existiu foi brilhante. Se não existiu também foi. Aprendi a não discutir o que funciona. Foi assim que achei meu Achilles, adaptado. E com calcanhar também.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

O fator químico na minha visão filosófica - ou - eu também quero isso que você está tomando

Os dias têm sido longos mas nem tão lentos como eu imaginei que seriam. Parei de ficar sentada reclamando e tomei algumas providências, e obviamente como mágica as coisas funcionam, nem todas, mas algumas despertam do sono atávico.

Primeiro estou em um dilema filosófico do tipo ovo e a galinha, porque achava que drogas que interferem no cérebro são só paliativos e na verdade precisamos mesmo é resolver nossos problemas. Mas como em geral não temos todas as chaves deles, eu me perguntava se valia uma ajudinha, ou se tinha que ser cold turkey ao contrário, ou seja a validade da medicação que é alvo de discussão de pessoas qualificadas entre as quais eu não me incluo. E daí que me pus sob o efeito de drogas (lícitas e prescritas) e daí que tudo ficou mais fácil. Não estou abobada, não durmo o dia todo, depois de uns ajustes de dosagem, continuo sendo eu. Na dose inicial não era eu, foi muito engraçado porque era eu bêbada, alguma eu que não estava funcional. Feitos os devidos ajustes, esta eu ainda sou eu, só que os cavalos desenfreados que corriam na minha mente estão pacatos, eu não estou histérica, o mundo não está acabando, o copo está meio cheio e não meio vazio. Eu estou mais suportável a todos que me cercam, e principalmente para mim mesma. É válido ou estou trapaceando? Mas trapaceando quem? A associação dos masoquistas? A confederação do mau humor? A sensação de alcoolizada sem uma gota de álcool é o melhor de tudo, não é perigoso para dirigir, não dá ressaca, não se passa dos limites, é o crème de la crème da bebedeira, a desinibição sem os efeitos colaterais. Pus de castigo a minha carrasca interna. Quando ela começa a ladainha eu digo "E daí?" e ela se cala.

Eu achei que precisava dessa muleta cerebral porque a vida muda muito rápido, e estava me atropelando. Ainda está, mas eu saí da frente, uma hora as coisas que eu tenho que decidir vão gritar e eu vou ter que dizer sim, não, assim sim, isso aqui não, mas sem choro nem sangue nem ranger de dentes, vamos fazer o que temos que fazer sem drama e sem frescura, porque a minha paciência pra isso já deu.

Isto posto andei sumida por confusão mental, acertos de dosagem, e coisas que muito, muito me surpreenderam e me surpreendem a cada dia mais, eu voltei depois de muito tempo a sentir um gostinho de alegria, e vi isso espelhado em outra pessoa, o que foi ainda mais emocionante.

Acho que caí no buraco da árvore da Alice, sei lá se era para lá que eu queria ter ido, ou fui para Nárnia, ou fiz o shift para Matrix, teletransporte, the twilight zone, you name it, sei que, com drogas ou sem drogas, hoje posso respirar sem me torturar. Todos devíamos tentar isso. É possível.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

De tempos em tempos um furacão passa pela minha vida. Depois da passagem dele, eu fico alguns dias em estado semi-catatônico, juntando os pedaços espalhados. Desta última vez foi tão intenso, a dor foi tão aguda e a beleza da catástrofe tão hipnotizante que somente hoje depois de vários dias consegui começar a sair do limbo, os olhos deixaram de ficar arregalados.

Preciso organizar as idéias, recolher o que sobrou nos escombros, porque ao que parece em sua próxima passagem o furacão vai me levar junto. Preciso saber se estou preparada para o vórtice, para o pulo derradeiro, e isso toma tempo. A distância ainda que dolorida acaba sendo necessária e um bálsamo. É hora de contabilizar. E decidir se tenho coragem de aceitar aquilo que quero.

sábado, 15 de outubro de 2011

O medo, a dúvida e a coragem.

Eu caminho como quem anda sobre o gelo fino, à beira do precipício, pisando em ovos. Uma hesitação, o cálculo errado de peso, o reflexo do sol, e é o fim. O fim me espreita e me enche de pavor. E o pavor me leva cada vez para mais perto do fim. E no entanto ele não chega. Mas está à espreita para - quem pode me dizer?  - vir para ficar. Ou não ficar. Mas em todos os momentos as armadilhas do caminho já vão me matando aos poucos.

As situações extremas sempre me impressionam quando vejo em um filme, leio em um livro - grandes catástrofes, guerras, doenças incuráveis, perdas irreparáveis, ou até as chateações diárias que vão se acumulando até virarem polvos com tentáculos dos quais não conseguimos mais escapar. Mas para serem extremas não precisam ser tão palpáveis.

Aquilo que vamos arrastando todos os dias, o que vai nos consumindo por dentro, comendo-nos vivos aos poucos, as punhaladas ora no coração, ora no estômago, o entre esperança e desespero, o não saber, o não aceitar, o não poder saber, o esperar, o desistir, o grande ponto de interrogação. Tudo isso vai minando nossas forças, cada dia um pouco, uma gota por vez, quando se vê, a infiltração vem derrubando as paredes.

E o medo, o medo. O medo de deixar ir o que tinha que ser para ficar. O medo de não deixar ir o que deveria partir. E o medo de não poder decidir, esse sim, o mais cruel, o que nos põe de joelhos, mãos no rosto, e nem lágrimas servem mais.

O vórtice, o redemoinho, o escoadouro que ameaça levar tudo, tudo como se não tivesse sido nada. E poderia. E deveria. E seria. Mas a voz grita lá dentro, no mesmo lugar onde já gritou antes - e ela tinha razão. Mas nem sei se é a mesma voz ou se é o medo falando, ele tende a ser enganador, venenoso, cheio de truques.

E a dúvida. O coração dividido sem saber para que lado ir. Ou se deve ir para nenhum lado e ficar quieto que dá menos trabalho e dói menos. E ainda mais estranha é a presença da dúvida - onde antes as certezas pareciam absolutas. Mas apesar de tão cruel quanto o medo, a dúvida pelo menos oferece a possibilidade da possibilidade - a opção. Resta saber onde encontrar a coragem para fazê-la.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O meu desejo atendido que caiu nos meus braços acaba de cair no chão, e quebrou irremediavelmente. A felicidade durou umas trinta horas e acabou. Estou de luto. E vai demorar para passar.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

A gente quer...



Grande parte da vida é desejar. O óbvio é o atendimento às necessidades básicas. Depois disso começa o perigo, começamos a querer. Desde o início da vida desejamos. Primeiro colo, depois brinquedos, depois objetos variados, aceitação, amor, realização. Alguns desejos nos engolem e nos fazem escravos. Dos materiais não quero falar, esses são objeto de discussão de quem sabe do que está falando. Eu hoje modestamente também sei do que estou falando, mas é intangível.

Os desejos não cessam nunca, o que é bom, porque senão estaríamos mortos, porém, também nos escravizam. O mais engraçado é quando vemos a perspectiva de um desejo há longo tempo acalentado tornar-se real. Eu vejo a imagem dos braços abertos esperando uma coisa cair. E quando ela cai, finalmente, depois de muito sangue, suor e lágrimas, não sei o que fazer com ela. Realmente temos que tomar cuidado com o que pedimos. Eu levo dias para processar grandes coisas que acontecem. Ainda está em andamento. É dolorido, porque os meus processos nunca são simples, eu pedi tanto uma complicação que consegui. E ao mesmo tempo, é magnífico, é tão grande que em alguns momentos nem cabe dentro de mim.

Eu tenho medo. Você tem medo. Mas nós dois queremos o que sabemos que queremos. Guarde as suas armas. Recolha os cacos que ainda sobraram e jogue fora. Não adianta procurar mais nada, já encontramos. Nada mais resta a não ser fechar os olhos e pular. Não há garantias. Não há certezas. Só desejo.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011



Eu já tive vários tipos de relacionamentos com a expectativa. O suficiente para concordar com tantas opiniões diversas. Como todo sentimento depende do que fazemos dele, e de quem manda em quem. A expectativa pode ser irmã da ansiedade e prima distante da decepção. Ou pode ser a melhor parte da festa, esperar por ela. Atingir o equilíbrio para mim sempre foi o grande desafio, e eu tenho um problema de enxergar o meio copo vazio que venho tentando resolver há tempos.

Mas desta vez a expectativa que me visita é a que só está me mostrando a cara bonita. Eu entrei na contagem regressiva sem entrar no campo de batalha. Eu estou até respirando. Embalar uma expectativa que não morde é uma das melhores sensações que podemos viver. Saber que as coisas vão se desenrolar sem sustos é um alívio, apesar de isso não ser uma certeza, não pode ser, por motivos óbvios - nada é certo. Mas esperar o melhor é uma escolha que estou aprendendo a fazer.

Neste caso específico a expectativa é de uma coisa que com certeza vai ser boa, então é uma covardia. Mas mesmo assim, em outros tempos eu conseguia me consumir até com isso. O que dizer?  Não existe mais falta de ar, disparar de coração, não comer, não dormir. Eu gostava disso, mas isso me consumia. Agora, só a certeza calma do desenrolar das minhas certezas que me são tão caras.

Que venha.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Omnia mutantur



Aprendi definitivamente mais uma coisa que a experiência me trouxe. Digo definitivamente porque isso se diz a rodo, mas de maneira vazia, as pessoas repetem porque acham bonito, correto, ou porque não têm mais nada para dizer. Eu vivi. Tive um momento epifânico.

Tudo muda. Absolutamente nada é imutável. Incorporei isso depois de muito penar para aprender. As palavras e expressões nunca, sempre, de jeito nenhum, nem pensar, e outras do gênero, são risíveis. As nossas certezas são ridículas. Isso automaticamente elimina qualquer categoria de adivinho. Sem tirar o crédito deles, mas não dá para adivinhar alguma coisa que pode mudar daqui a cinco minutos. E qual seria a serventia, de qualquer maneira?

Eu praticamente vi diante dos meus olhos uma montanha mudar de lugar. Certezas absolutas e decisões definitivas de repente caem por terra sem aviso, a petulância humana não tem limites e se julga dona do futuro - que afinal nem existe, se pensarmos um pouco. A minha petulância já chegou a níveis estratosféricos, eu era cheia de grandes certezas, convicções imutáveis, opiniões formadas. Rá. Só isso mesmo, rá.

Essa constatação da dança incessante de fatos e comportamentos, ao contrário da incerteza esperada, me acrescentou uma paz que eu não conhecia há tempos. O "this too shall pass" é meu velho conhecido, dolorido demais, porque o que é ruim demora a passar, e o que é bom não queremos que passe mas passa também. Enfim, quando tudo é inexorável, o que se há de fazer? O que sobra para fazer?

Quantas, quantas noites de vigília, dores, desesperos, ansiedades, quanto desperdício. Está ruim? Vai mudar. Está bom? Vai mudar. No meio disso tudo, acho que o que resta é aproveitar muito o que estiver bom, enquanto não vai embora. E esperar que depois do bom venha o melhor. Porque isso também é mudança, e é essa que eu quero esperar.

sábado, 10 de setembro de 2011

Vista do sol


Essa imagem é em tempo real. A distância física é real. A vista é de tirar o fôlego. Olhar o planeta assim e imaginar que estamos ali em um dos pontinhos de luz é surreal. A imensidão do planeta é relativa - quando se olha de baixo para cima é imenso, de fora para dentro é minúsculo. Quando outros olhos olham nossas mazelas, outras luzes se acendem, especialmente se forem olhos cheios de luz. O oceano parece incomensurável, mas de fato não o é, porque está contido na bolinha, claramente delimitado e finito. E no entanto alguns (poucos no contexto, muitos no coração) quilômetros parecem a explicação de Einstein para a teoria da relatividade. Anos de vida mal vividos parecem um tempo infinito perdido. Convivências de longos anos perdem para períodos curtos de intensidade. E os anos por vir parecem curtos ainda que se estendam, nunca será suficiente para a felicidade que está por vir. A paz. A tranquilidade. O silêncio da noite que calado anuncia que o planeta continua girando e daqui a pouco será sol de novo.
Dias e noites de saudades.
Saudáveis.
Suaves.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

And yet...


Eu estou titubeando. As coisas demoram tanto para ficarem, na minha rígida e meticulosa opinião, aceitáveis, e quando ficam, eu começo a achar outros problemas para elas ficarem inaceitáveis. Sou só eu? Eu sei que isso é comum, mas nessa proporção acho difícil. Os cenários desastrosos que eu crio dentro da minha cabeça são dantescos. Tudo parece tão calmo que não pode ser verdade. Aconteceu mesmo aquilo que eu queria? Não é possível, deve ter alguma coisa que eu não estou vendo. Alguém com certeza está me enganando. E existem duas vozes em mim, uma que diz essas coisas e a outra que cala, porque sabe que isso tudo é irracional, irreal e prejudicial.

Ainda me falta tanto equilíbrio para conquistar.

E no entanto, apesar da ansiedade descomunal gerada pela elucubração infinita, a capacidade inata de achar pelo em casca de ovo, a tendência desprezível de cair no drama, a racionalidade quieta no fundo só observando o circo e balançando a cabeça, ainda assim e com tudo isso, pelo menos em uma coisa ainda consigo fechar os olhos e pular. No meio do caminho o pavor é imensurável, eu me sinto incomunicável e sem retorno, sem volta, sem saída. O chão me falta, o ar ou a falta dele me faz arfar, mas ainda assim, fecho os olhos e me apaixono.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Perguntas, perguntas, e algumas respostas



Eu não tenho nenhum jeito com crianças e/ou adolescentes. Eu não sou aquela pessoa que rola no chão com sobrinhos ou desconhecidos totais filhos de alguém. Choro de bebê me dá nos nervos, quando vejo criança mal-educada dando show em público tenho vontade de estapear. Os pais, obviamente, porque não estapeiam seus filhos. Eu só digo que a criança é linda e fofa se ela de fato for, sim, existe criança feia. Mais bruxa malvada que eu impossível.

No entanto eu tenho dois afilhados cujas mães desavisadas cometeram a loucura de escolher a madrinha malvada. E no entanto de novo, eles me amam. E eu os amo como se fossem meus, de verdade, só sem a parte da melação. Portanto não sou assim tão perigosa.

E eu sou mãe. E essa é a melhor coisa que eu fiz a minha vida toda, foi minha melhor produção. Não era o meu sonho desde que eu nasci, mas eu quis e fiz, e foi o trabalho mais perfeito que realizei. Ocorre que obviamente minha filha não nasceu adulta - e nem chegou lá ainda. Pela fase em que às vezes queremos jogar na parede ou sair andando e não voltar mais já passamos, e foi bem superada. Houve muitos outros agravantes, eu não passei no teste de aptidão para mãe, mas é uma profissão em que as desqualificadas acabam se virando. E ela resultou bastante equilibrada se for considerado o que a rodeia, e aqui já não estou falando mais de mim, e nem vou entrar no mérito para não ser mais apedrejada.

O fato é que ela é por demais questionadora e tem um repertório de questões existenciais de fazer inveja a quem tem o dobro da idade dela. O bom é que essa qualificação de respondedora eu tenho; e eis que ela me pergunta por quê se ama a pessoa que amamos. Como é isso? Por que esse e não aquele? O que esse tem de especial? Enumere pelo menos duas coisas que são as mais importantes. E como se não bastassem as minhocas que já moram na minha cabeça, ela instala mais essas. E me pôs para pensar.

Eu como sempre me saí bem na resposta porque sou pós-graduada em enrolação, mas de verdade mesmo, por que esse e não aquele? Qual é a qualidade principal? Como? Em que momento a gente sabe? Algumas coisas não quis responder apesar de saber que poderia, porque prezo demais a minha privacidade (diz a que escancara no blog). Disse verdades. E depois pensei nelas. Já notei que nossos primeiros amores, entre os quais em geral fica o casamento, são treinos. No casamento cometemos todos os erros possíveis por pura falta de prática. É o treino. Depois, os amores maduros são uma outra história completamente diferente. Para começar depois de uma determinada idade fazemos só o que queremos e as concessões só são feitas para grandes amores. Eu só me digno a me montar e sair em cima do salto se for por algo que realmente valha a pena, porque já não preciso provar nada para ninguém, então para sair de casa e ouvir bobagem, fico lendo um livro que é uma boa companhia garantida. Ou vejo bobagem na televisão mesmo - de pijama.

Então disse a ela que o fundamental, o básico, é alguém que saiba do que a gente está falando. Eu já estive em tanta conversa de surdo e mudo, parece que estou falando em outra língua, mas de outro planeta, nem terráquea. Ou egos do tamanho de elefantes, aquele elefante que fica na sala e eu tenho que fingir que não estou vendo. E no entanto, existem as pessoas com quem temos ligações diretas boca-cérebro. Aquelas com quem não precisamos completar algumas frases. Aquelas para quem lançamos aquele olhar em determinada situação e que significa "você sabe o que eu estou pensando". É para quem dizemos e de quem ouvimos "você sabe do que estou falando". É quem nos diverte. Rir junto é fundamental. É quem é complicado. Já ouvi "sou simples" como se isso fosse uma vantagem. Não é. Pessoas complexas são universos com quem compartilhar a vida. Acrescentam. Ouvem. E ela surpreendentemente lançou a palavra "atencioso" que eu jamais esperaria ouvir dentro das circunstâncias da conversa. Mas sim, cabe também.

Mas eu não sou totalmente desprendida não. A uma altura dessas da vida não dá não. Aparência? Sim. Mas o que me parece bonito a outros olhos pode não parecer. É o pacote, eu ouvi. Eu sou um pacote também, todos somos. Cabe a cada um saber o conteúdo fundamental. Ilusões já não temos mais, eu nem consigo alimentar as de uma adolescente, não sei fingir, minto mal demais. E o momento em que percebemos que estamos apaixonados? Como dá pra saber? Talvez seja o momento em que nos permitimos.

Hoje sim.



Eu já ouvi que adoro sofrer, arrastar correntes, chafurdar no pântano da tristeza. Não posso concordar que adoro, mas de fato caio nessa com bastante facilidade. Sempre odiei o drama e apesar disso muitas vezes me peguei concorrendo ao oscar da canastrice. Concluo que ficar triste é fácil, quem tem cavalos desgovernados na cabeça exacerba mais ainda o derramar de lágrimas e o desespero descabelado.

Mas hoje não. Me peguei saboreando um momento. Nem foi um fato, evento, nada ocorreu. São coisas que vêm ocorrendo. É a vida em progresso. É o processo. E quem diria, a felicidade é mesmo o caminho, e não a chegada, e por mais clichê que isso seja, é verdade. O fato do sol ter aparecido foi um ajudante, e nem os pensamentos de preocupação fundada e infundada que me atormentam diariamente conseguiram tirar a sensação de mim. Uma sensação assim, de sentir bem por sentir uma coisa específica. Piegas até cansar, mas bom. Isso é raro. Não se pode deixar escapar, I'll enjoy as long as I can hold it.

domingo, 4 de setembro de 2011


Há alguns anos isso nem me passaria pela cabeça. A vida parecia tão... resolvida. E então ela foi se des-resolvendo, a confusão se instaurou, mudou tudo e depois de algum tempo e um pouco de análise, nada tinha mudado. Isso acontece às vezes, achamos que tudo mudou, mas só maquiamos mais do mesmo. E como o que era nos incomodava, quando achamos que mudou achamos de novo que está tudo resolvido e nos acomodamos de novo. E aí para notar já é muito mais difícil. O mais fácil de acontecer é nem notarmos, e como tudo fica confuso de novo, achamos que nos enganamos e voltamos atrás naquilo que afinal de contas nem deveria ser tão ruim assim, já que o incômodo continua mesmo sem a pré-confusão original.

Cheguei quase a voltar atrás, aliás tive uma recaída significativa que poderia ter me atirado para sempre no abismo do sem sal. Mas por algum motivo algo me dizia que tinha que continuar indo, just keep walking. Mas os caminhos não levavam a lugar nenhum, todos tinham as mesmas árvores, os mesmos rios, a mesma paisagem sem graça de antes, e eu andava em círculos. Mas não via nada. só que algo me dizia que ainda tinha mais alguma coisa a ser vista. Não era possível que fosse só aquilo.
E o caminho de repente ficou diferente. Fácil? Florido? Absolutamente não. Mas era esse o caminho que eu tinha que encontrar. Não sei aonde ele vai dar. Mesmo porque até agora tentei manter o mesmo ritmo de caminhada. Só que agora me parece que novos caminhos requerem novos passos, novas maneiras de caminhar, mais coragem, mais ousadia, porque o fim do caminho vai ficando cada vez mais próximo, e já não dá mais para ficar andando em círculos. Talvez agora sim, seja hora de


sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Carta de alguém para alguém, com nenhum assunto em particular


*Essa carta é a do filme "Letters to Juliet", um filme para pensar no que fazemos com as nossas oportunidades.

"Um dos meus piores desafetos é o Gregório, que quis impor uma contagem de tempo ridícula que não faz nenhum sentido e deve ter contribuído para os descaminhos que a humanidade percorreu por falta de orientação das estrelas. Mas uma coisa que aprendi nestes últimos dias é que preciso de alguma maneira viver em sociedade, e portanto, adaptar-me a algumas regras básicas como o calendário, por exemplo. Sendo assim, mais uma vez nesta semana fiz o que não gostaria, mas diferente das outras ocasiões, esta não me desagrada. Passaram-se doze meses desde o dia em que te vi pela primeira vez. E daí? E daí mesmo, mas já que eu acabei me lembrando, no meio do vórtice em que caí nestes últimos dias, quis te contar, por nenhuma razão mesmo.
Já discuti comigo mesma milhões de vezes a história do copo cheio e do copo vazio, e estou plenamente ciente de estar olhando pelo lado errado, e como parte do aprendizado de aquisição de novos olhos, que fiquem registradas algumas coisas, antes que elas passem, antes que alguém as tome de mim, antes que elas virem outras coisas, porque a transitoriedade é a única garantia.
Pouco sei dizer porque acabo na choradeira, as ideias se organizam melhor no papel, pouco faço, pouca coragem tenho, pouco vivo. E vivia menos ainda, e nem sabia o que existia além. Já discutimos que às vezes a ignorância é melhor, nos poupa de dores maiores, mas uma vez que temos conhecimento do que existe, uma prova de gosto de mundo, existem dois caminhos. Um é fingir que não se viu, e continuar no modo zumbi até morrer, o outro é provar mais do que nos agradou. Esse último é o caminho perigoso, cheio de armadilhas, e onde eu finalmente me vi sozinha nestes dias, sozinha de uma solidão atávica, aquela em que não adianta companhia, não adianta ninguém dizer estou com você, aquela que deve ser a mesma que sentimos quando nascemos, e quando morrermos, é a solidão intrínseca, aquela dos que crescem e arregalam os olhos no escuro tentando saber o que aconteceu. Mas uma vez escolhido o caminho, as pontes são queimadas atrás de nós, as montanhas se erguem do nada, e a única opção é seguir em frente. E me parece sempre que o caminho vai ficando cada vez mais estreito, mais frio e mais inóspito.
Mas existem as paradas no caminho, os oásis, em algum desses encontrei você, que vinha também no seu caminho inóspito – mas lembre-se, as pontes queimaram – assim como todo mundo, apesar de parecer que só a nossa dor dói, a dor do outro também é dolorida.
E agora acabaram-se as minhas metáforas, eu viajo tanto nelas que se continuar vai parecer Alice no país das maravilhas, o que não deixa de ser uma boa referência de insanidade necessária. Você tem sido um apoio necessário que eu não sabia que precisava, ou sempre precisei mas não tive nunca, só arremedos, projetos, falta de vontade. Eu não vou me repetir, os elogios eu consigo manifestar, outros poderia tentar, mas acaba soando vazio. Eu poderia te dizer isso tudo a qualquer momento, então vou aproveitar este senão fico esperando o momento se manifestar e – de novo – as coisas mudam, acabam, ficam mutantes com tentáculos, e eu deixei passar. Independentemente dos momentos de dor, que não foram raros, isso deve ser dito, e dos outros, de confusão, de dúvida, do sentimento de impotência diante de tantas verdades, que afinal, não são absolutas, como nenhuma é, apesar de tudo e por tudo, foi um ano mais intenso que dez anos outros do resto que eu vivi, foram dias preenchidos, seja com dor ou com alegria, mas no balanço final aprendi muito, o que já é um resultado positivo. E antes que eu me esqueça, que as coisas mudem ou que eu morra, queria que você soubesse disso. Por nada, não, só para seu conhecimento mesmo."

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Nota para os meus inúmeros (dois? três?) leitores

Eu estou ausente lutando as minhas batalhas.

Eu entro, saio, faço e desfaço malas, estou fazendo as malas definitivas para sair para sempre do passado com destino ao sei lá o quê.

Um campo de guerra não é para sissies. Naturalmente não está sendo fácil.

Mas eu estou me saindo bem. Espero poder voltar em breve.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Procedere debet


O silêncio da tarde e a inquietude no coração me levam ao pré-campo de batalha. Eu quase consigo respirar o ar bélico naquele crepúsculo antes do tilintar de armas. Sim, é um campo de batalha onde as armas tilintavam, não sei se é a influência de uma leitura recente da Ilíada, mas eu quase vejo os elmos e escudos, as espadas e cavalos. Os guerreiros estão alinhados, a poeira ainda não acabou de baixar, levantada que estava com as manobras de cavalos, carros, carroças. O fogo arde em vários pontos, a fumaça sobe, da refeição que vai ser a derradeira para muitos. O silêncio impera, apesar dos milhares de homens, eles estão concentrados, pensando no que deixaram longe e se vão voltar, e não no que os espera, porque se pensarmos muito na batalha, nem entramos nela. E eu obviamente não sou o soldado raso perdido entre muitos, porque esta batalha é muito minha. Eu sou o general desse exército de emoções, vivências, desilusões, desespero, momentos de total estupefacência, por não acreditar que pode ser tão ruim - ou tão bom. Essa batalha é minha para comandar, eu passei a vida toda reunindo esse exército, fiz alianças erradas, paguei o preço, amarguei os prejuízos, cobrei os impostos, arrebanhei as fileiras, vendi a alma para comprar armas.

E hoje o silêncio cheio de almas, de vidas inteiras contidas na minha, cheio de pó de preparativos, de pó de erros e acertos, de busca, de aquisições equivocadas, estratégias mal-armadas, mapas que acabaram não levando a nenhum lugar, e que tarde eu percebi que saíam de lugar nenhum; conselhos de guerra intermináveis onde ser revelaram aliados e traidores, os cavalos, que correram por tanto tempo dentro da minha cabeça, os cavalos-pensamento desgovernados que acabaram me fazendo desmontar neste campo, onde estou à frente. Os generais devem ir à frente de seu exército, e me custou tanto entender isso, eu que sempre mantive escoltas e comitivas que me precederam.

Não mais. O ar rescende a sangue, suor e lágrimas. Pólvora, ferro e fumaça. Determinação, confiança e coragem. Neste limiar onde faltam tão poucas horas para a luta, não há mais retorno. E nem para onde retornar. Eu respiro fundo e não penso mais. É como dançar. Quando a gente entende que tem que deixar o corpo fazer o movimento sozinho, a gente aprende. E não existe desaprender. Uma vez no calor da batalha, é vencer ou vencer.

Alea jacta est.

terça-feira, 26 de julho de 2011

So close...


and yet still so far.

Eu nunca, nunca estive tão perto de finalmente saborear a vitória, e saber que gosto tem, colher os frutos da minha santa paciência.

Não vai ser agora que vai me escapar.

É engraçado como viramos leões quando o pulo a ser dado requer o tamanho exato das patas do leão.

Faltam apenas alguns centímetros.

domingo, 24 de julho de 2011

She said no, no, no


James Dean, Marilyn, Michael Jackson, Cazuza, entre tantos outros, live hard, die young. E agora Amy. Vinte e sete é muito pouco, ainda mais para uma voz dessas. Mas ela mesma já havia previsto, já tinha avisado que preferiria viver pouco a não poder viver como queria. A rehab foi sempre uma piada, she says no, no, no, entra, sai, entra de novo. A opinião geral é que Amy antes de Blake tinha tudo para dar certo. Foi Blake que "estragou" Amy. Será que isso é possível? Só de ouvir o que ela canta já dá para se dizer - quem nos estraga somos nós mesmos.

As escolhas. Dizer que alguém atrapalha nossas vidas é tão fácil, a responsabilidade passa adiante. Amy escolheu Blake na vida dela. A vida se tornou mais difícil? Se não fosse Blake seria outra coisa. Ela escolheu. É chocante para nós, nos incomoda, ver alguém tão jovem se auto-destruir. Mas por que? A quem incomoda? As mazelas são feias. Mas o que mais incomoda é ver a coragem de quem faz a escolha, ainda que seja a mais difícil. Auto-destruição, auto-mutilação, droga, álcool, entra e sai do rehab, a máscara que vai caindo, cada vez mais vai sumindo a moça com potencial de diva e aparecendo a escolha. A escolha feia que ninguém queria ver. Mas foi a escolha dela. E por mais que tenhamos que nos encaixar em leis, recomendações, estatutos, conveniências, no fim, a decisão é de cada um mesmo. Por mais feio que pareça a quem estiver olhando.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Midnight in Paris


Fui ver e já aviso que aqui tem spoilers.

As "comédias" de WA são as que eu aguento. Porque quando se diz comédia, as pessoas em geral se imaginam rolando de rir no chão, em geral com uma sopa de clichês e pastelão. Sim, assisto essas às vezes, mas a minha paciência dói, principalmente pela total previsibilidade do que acontece e do final.

Allen poderia fazer mais jus à sua fama e também ser menos final-feliz-e-previsível. O filme é lindo, as cenas de Paris são maravilhosas, a idéia é fantástica, mas o final - vou ter que repetir a palavra - previsível. Depois da viagem no tempo, ele escolhe o herói dispensando a noiva frívola para ficar com a mocinha alternativa que também gostava de Paris na chuva.

Mas o final feliz é totalmente perdoável face a todos os personagens que aparecem e são magnificamente retratados. Dali e os rinocerontes está impagável. Eu amo o absurdo. O impossível. O improvável. O filme não poderia ser mais apetitoso, recheado de tudo isso.

Mas o que me fez pensar foi o sentimento que Gil compartilha com Adrianna. A nostalgia do tempo não vivido. Eu já tive isso, acho que todos tivemos. Eles o tinham exacerbadamente, Adrianna desvanece no tempo até. Mas o que é interessante é como buscamos o que não temos. Gil tinha uma vida confortável, fazia filmes que ele mesmo considerava ridículos mas era regiamente pago para isso. Uma noiva que ele considerava atraente e que ele provavelmente achava que era suficiente. Mas tinha a alma inquieta, então inventa de escrever o livro que Gertrude Stein vai acabar lendo e fazendo a crítica (!). Seu personagem era ele mesmo, e ele tão ensimesmado nem nota que a noiva o trai, alguém precisou ler o livro para dizer a ele.

E como ele vamos buscando, muitas vezes uma coisa que não vamos nunca encontrar, voltar no tempo é só para Gil e Adrianna. Ele acaba tendo a epifania, ela não. Escolhas. Mas será que, como Gil diz, depois que você viver o suficiente na Belle Epoque, vai se cansar dela e querer voltar mais, viver outra coisa que já passou?

Por que nos falta tanto? Por que procuramos no passado, no futuro, na droga, no álcool, no trabalho, na dedicação às causas perdidas, em outro país, em outra cidade, em outro mundo? De quem fugimos ou atrás de quem corremos? De quem poderíamos ter sido ou que poderíamos vir a ser?

É corrente que a cabeça vazia é a oficina do diabo. Eu discordo. Acho que a cabeça cheia demais é que é. Os pensamentos nos engolem, lá dentro da cabeça voltamos no tempo, vamos a lugares que não existem e vemos coisas que não aconteceram, e vivemos como se fossem reais. E por mais que nos provem que não são, é como Gil - ele se encontrava com Fitzgerald, Stein e Dali, sim, quem pode dizer que não? Ah, a insanidade. A exata medida da insanidade sã.

Ou podemos simplesmente fazer a escolha de Adrianna. A mais simples. A menos trabalhosa. Até segunda ordem. A insatisfação humana não tem fim.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Ele disse, ela disse, eu deixei passar


Quando já temos uma idade em que lembramos muito bem dos anos oitenta, às vezes onde viemos parar hoje ainda assusta um pouco. No meu caso específico, por ter o computador como companheiro de trabalho em tempo integral, apesar de só saber fazer o que preciso com ele, aprendi a me comunicar com o mundo para amenizar a solidão que o meu trabalho me impõe.

Para os mais jovens é muito natural o ritmo dos relacionamentos e a maneira com que se descarta o que não serve mais, a linguagem nem sempre é delicada, tudo se sabe, o mundo virou uma cidadezinha do interior com uma rua principal e uma praça onde se faz o footing. Para a minha geração e as anteriores ainda restaram algumas coisas com mais valor, folgo em saber. Obviamente essa não é a regra, não existe idade para a delicadeza ou a falta dela, só estou generalizando.

Mesmo porquê, o que descobri nos últimos foi em mim mesma. Em geral, talvez pela maior facilidade de sabermos o que os outros estão pensando porque é publicado para o mundo em tempo real, acabamos conhecendo mais gente mais a fundo, o que é paradoxal com a impessoalidade do virtual, mas é fato. E o que eu observei é que a prosaica fofoca não só ganhou proporções homéricas como automaticamente se tornou mais aceitável pelo status de normalidade que acabou conquistando. Falar mal de alguém ficou tão banal que ninguém nem percebe. Criticar, desde o vizinho até o chefe da nação vizinha, é tão trivial como dizer bom dia a todos. Não vou discutir os merecimentos, só estou aqui me atendo aos procedimentos.

Mas nem é aí que eu queria chegar. O fato é que acabei descobrindo que, em particular como era antigamente ou em público como é hoje, criticar, xingar, fazer observações, fofocar, é muito simples. E me incluo aqui porque não fiz curso para buda, muitas vezes me achei venenosa mas continuei. Talvez seja da natureza humana e achamos sempre justificativas ou novos meios para apontar o dedo para o outro. Não sei se tem conserto.

Minha grande epifania foi na verdade perceber o quanto é difícil elogiar. Manifestações públicas de apreço são raras, noticiário de boas novas ainda não vi, homenagens a pessoas vivas são exceções. Isso no público, em particular, temos dificuldade de dizer o que é bom. Ter raiva é fácil, contar a todos os miseráveis maus-tratos a que somos submetidos pelo chefe tirano, pelo amigo mal-agradecido ou outros personagens é simples demais, mesmo porque todo mundo tem uma história dessas para contar.

O meu silêncio em reconhecer algo de bom me trouxe uma tristeza muito grande. A minha hesitação em demonstrar o que de bom se passava dentro de mim me privou de viver isso. Se ainda há tempo não sei. Mas aprendi, de novo com dor, que as más palavras saem rápido demais das nossas bocas. Estou tentando abrir as portas por onde saem as boas.

domingo, 10 de julho de 2011

Friends in need...


Eu sabia, mas sempre que vejo e vivo a mesma situação me emociono.

Eu vivo tudo ao extremo, e quando as coisas desandam, a dor é extrema.

Mas quase que instantaneamente muitos, muitos pares de mãos se estendem. E cada um traz o melhor de si, o que pode oferecer. E o valor é inestimável.

A todas as mãos que se estenderam para mim, que fique o registro que sim, o mundo ainda vale a pena.



...are friends indeed.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

É simples assim: não é simples



Eu já discuti comigo mesma inúmeras vezes, nem me lembro quando foi que isso começou a me incomodar, eu era muito jovem. Eu queria saber se vale a pena ser de verdade, quero saber porquê comecei a pensar, desde sempre eu quis saber mais, conhecer mais. Mas para quê? Inúmeras vezes presenciei, ouvi e li a respeito de pessoas para quem tudo é muito simples. A chuva derrubou a casa? Ah, a gente constroi de novo. Perdeu o emprego, está endividado? Ah, pra isso tem cartão de crédito. Acabou o casamento? Ali na esquina tem outro esperando. Em alguns momentos até me choquei com a simplicidade com que tanta gente toca a vida. Não tem isso, usamos aquilo.

Então fui percebendo que o segredo é a superficialidade. Basta não pensar no assunto, a vida se encarrega de levar adiante os dias, os acontecimentos, e não é preciso pensar. E o melhor de tudo - esse processo é totalmente inconsciente - quem não pensa não sabe que não está pensando, apenas vai indo. E então não dói.

O próprio fato de ter ciência de que somos seres pensantes e determinantes de nossas vidas já é uma carga pesada. Ser vítima, por exemplo, é muito fácil. Tem sempre alguém para culpar e diminui muito o trabalho que dá viver. Por exemplo, fulana não faz nada da vida porque apanha do marido. Obviamente repudio isso e entendo que as razões são inúmeras, mas dá muito menos trabalho. Ciclano teve uma infância problemática e agora é um assassino. Também tem suas razões justificadas, mas também é bem simples culpar alguém por algo que acabamos escolhendo fazer. Enfim, apontar o dedo é mais simples que fazer alguma coisa para mudar.

Mas apontar o dedo também é mais cômodo, assim como ir indo. E se há todas essas opções, por que alguns de nós escolhemos o caminho mais árduo? Eu poderia ter uma vida dormente, segui o script à risca, e quando deveria ter chegado ao "sossega, mulher", me rebelei, porque descobri que não precisava ter seguido o script. Poderia ter ignorado a descoberta, mas nãaaaaaaaaao........ quero ir ver o que mais tem para se fazer.

Aí então surgem as pessoas "simples", que assim se auto-denominam como se isso fosse uma vantagem. E deve ser mesmo, eu é que me torturo procurando o complicado. Para que pensar no assunto? Para que procurar as razões, os pontos a ponderar, os processos, as perspectivas? Para que analisar, destrinchar, e ir se cortando, machucando e sofrendo no processo? Por que o profundo e não o corriqueiro? Por que Nietzsche e não Paulo Coelho? Por que os livros, as aulas, a cabeça que não para um minuto de pensar, e não o churrasco de domingo na casa do Freitas da Contabilidade, como diria uma grande amiga minha que também comete pensamentos?

E eu corro atrás do que é complicado, talvez porque minha complicação busque uma irmã, um espelho, eu procuro desesperadamente quem me compreenda, fale minha língua, ouça de verdade o que eu tenho a dizer, com todo o meu vocabulário difícil,e por favor, sem errar na concordância. É, eu sou bem chata. Eu sou bem complicada. E dói muito, dá muito trabalho. Mas é um caminho sem volta, e estou nele há tanto tempo que as pontes pelas quais eu passei já caíram de podres. Só me resta seguir em frente.

sábado, 2 de julho de 2011



O inevitável, o incontrolável, o imutável. A decepção, o desespero, o desânimo. O engano, o desengano, a ilusão. O medo, a preocupação, a tristeza. A dor, a dor, a dor. Um redemoinho, vórtice, o abismo. Os gritos, bater de porta, o extremo. O erro, o exagero, o excesso. O não acontecer, não ser, a impotência.
E lá no fundo, nos extremos, nas pontas, no centro, nas bordas, com pontas afiadas, sem dó, sem cuidado, o olho no olho, a respiração entrecortada, breathless, breathless, ainda o sentimento.
Que não vai embora apesar de.

sexta-feira, 1 de julho de 2011



“Expose yourself to your deepest fear; after that, fear has no power, and the fear of freedom shrinks and vanishes. You are free.” — Jim Morrison


Eu pedi um sinal. Vieram vários. Eu achei que não era possível tanta auto-tortura. Minha falta crônica de modéstia me permite dizer que não sou nem um pouco burra, como é que em determinados assuntos eu consigo ser tão obtusa? Agora auto-adjetivação devidamente feita, nestes últimos dias ouvi lições óbvias de quem me conhece profundamente há muito, muito tempo e também se espanta e diz - onde está a pessoa que mora aí mas está se escondendo?

Bem, lendo isso aí de cima parece que coroou-se o despertar. O que está me podando, acorrentando minhas pernas, algemando minhas mãos e me amordaçando é o medo. Rá, que novidade. Mas o medo tinha virado pavor, pânico, mas pavor, pânico de que? A dor já não está incomodando? O que pode ficar pior? Mudar de dor? Pelo menos a alternativa tem perspectiva de acabar, esta não.

Então a ficha caiu. O verdadeiro pulo, aquele que eu venho ensaiando e de verdade, de verdade só fingi que dei, é este. É o pulo dentro daquilo de que eu mais tenho pavor. A liberdade é dolorosa. Ela é dura de conquistar, e muitas vezes tem gosto amargo. Mas a escravidão não é melhor, é só mais confortável. Moisés ouviu muita reclamação no deserto. Onde já se viu, o faraó pelo menos dava água, e o Moisés levou todo mundo pro deserto e enlouqueceu querendo que todos se afoguem no Mar Vermelho. Blá, blá, blá.

Mas um dia alguns de nós temos sorte de achar nosso Mar Vermelho, de olhar a fera nos olhos. De puxar a espada. De confiar no que vem, ainda que doa, ainda que seja o deserto árido. Porque Canaã está lá, todo mundo tem a sua. Nem todos encontramos, e ela nem sempre é a terra que esperávamos, chegamos a ter saudades dos maus tratos do faraó, mas é o destino dos escolhidos. A briga com a fera é feia, e deixa marcas. Mas ela acaba virando um bichinho.

terça-feira, 28 de junho de 2011


A gente sabe, né? Apesar das corridas desembestadas e dos pulos cegos dos precipícios a gente sabe que o coração vai quebrar. É que escolhemos correr o risco. Tentamos racionalizar, equacionar os riscos, planejar, ver onde dá para diminuir o perigo, mas no fim das contas bem lá no fundo sabemos como as coisas vão acabar.

De todos os vôos cegos que eu arrisquei na minha vida, este é o que tem causado os maiores desastres. E eu trouxe tão longe que agora deixar no caminho dá uma sensação estranha de irrealidade. E a ironia é que nunca houve o real que eu desejava, eu nunca consegui concretizar o que ficou no ar. E no entanto, soa tão real que não consigo aceitar a irrealidade patente.

O coração vem sendo empurrado há muito tempo, já está bastante avariado no processo, arranhado, marcado, partido, desgastado. Só não consigo decidir o empurrão final. Como saber quando é a hora?

Mas é assustador vê-lo ali, à beira do precipício. Tenho medo.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Cansei, né?



Eu já disse até cansar que para mim não tem meio termo, eu tenho que ser a louca que se joga em tudo e invariavelmente acaba quebrando a cara, pois é só isso que ultimamente vem acontecendo. E vou seguindo de cara quebrada mesmo, mas para tudo existem limites, e - what a surprise - acho que os meus começaram a se manifestar.

Eu sempre fui consciente e apesar disso reclamei e reclamo muito de que quem faz o que quer sabendo os riscos que corre acaba se machucando. E eu tenho feito muito do que eu quero, e muito, muito, excessivamente do que eu não quero mas acabo fazendo mesmo assim, pouca coisa razoável, e tudo o que tem ferido mesmo.

E daí que a minha beleza está ficando cansada. O que era engraçadinho, agradável, acabou deixando um gosto de inconveniente, a graça da brincadeira está acabando. A minha tolerância quando me interessa é muito, muito alta. Mas quando eu sinto que algumas linhas foram cruzadas - eu diria até atropeladas - o muro se ergue.

De vontade própria e total acordo demonstrado mas não sentido tenho fingido que não vejo, não ouço e não ligo. Mas quando as coisas são gritadas e sinto que os limites são testados me vejo na posição de mostrar onde eles se localizam.

E o melhor da história toda é que o cansaço é sincero. Não é esforço nenhum dizer - me deixe - ou, essa brincadeira perdeu a graça, algumas coisas são totalmente desnecessárias, e, acima de tudo, cresça e apareça.

Assim, eu oficialmente para mim mesma me recolho, vou avaliar, pesar, como me foi sugerido, vamos ver para que lado a balança vai pender, a uma altura dessas, eu já não estou mais para viver a adolescência tardia, me poupem, por favor.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Run Lola Run



Os meios de transporte acabaram virando cúmplices da minha insanidade. Eu entro no carro, saio do carro, faço e desfaço as malas pra depois fazer de novo e empreender uma odisseia para chegar ao aeroporto, ônibus, carro, táxi, avião, eu vou, eu vou indo, eu vou perseguindo em vão o que cada vez mais tenta fugir de mim, e o que cada vez mais suscita perguntas sem respostas, atos que não combinam com palavras, erros cometidos, palavras traiçoeiras, enganosas, com vida própria, saindo na hora errada, palavras duras, palavras tristes e cansadas, e mesmo as que deveriam ser doces já saem com o fundo de amargura, esse amargo na boca, o engolir em seco, o soco no estômago, a faca no coração, a dor, a dor, a dor. E ainda assim eu vou indo, às vezes me deixando placidamente ficar, às vezes esperneando e arrastada, mas eu continuo. O tempo já estabeleci, do espaço desisti, já nem sei por onde andei, deixei tudo para trás, eu sei, eu sei que chegou a hora de retomar o que eu fui deixando pelo caminho, mas ainda não consigo parar.

segunda-feira, 13 de junho de 2011


*

Eu já disse em algum momento e vou repetir agora, talvez em outros termos - Homem poderoso é o maior afrodisíaco que existe.

Por poderoso entenda-se aquele que conhece a ciência de chegar, olhar e resolver. No trabalho, porque obviamente isso limita-se ao mundo profissional / corporativo / business / whatever, porque quando as questões se ampliam em áreas mais complicadas e pertencentes aos contos de fadas, normalmente não são eles que põem o p** na mesa.

Está aí, por exemplo, entre tantas outras, a Cleopatra, que não me deixa mentir. E outras rainhas, Elizabeth, a do Sabá, não rainhas, não princesas, a que está ao alcance do olhar ali mesmo, olhando o homem das cavernas trazendo a caça para a caverna. E achando o máximo.

* Todo mundo registrou quem autorizou? Ótimo. Só pra constar.


A emancipação feminina é um assunto que preencheu, preenche e não vai parar de preencher páginas e páginas de discussões, posicionamentos, palpites, bobagens e considerações sérias. A minha única qualificação para falar do assunto é o fato de eu ser mulher. De resto não sei nada, não analisei, não saio lutando pelos meus direitos, sou alienada até, não parei pra pensar. Mas acho que posso falar porque sinto na pele determinadas coisas relacionadas ao tema.

Se não fosse tão complicado de viver seria hilário de ouvir contar.

Os homens aparentemente, eu achava, dividiam-se nas opiniões a respeito da mulher independente (inclua-se aqui todos os adjetivos relacionados e associados). Eu pensava que havia dois tipos - os que continuavam nos anos cinquenta e ainda achavam que a mulher era objeto e second class citizens (inclua-se aqui também todos os outros clichês), e os que aceitaram até de bom grado a divisão dos fardos e achavam a mulher independente o máximo, inclusive procurando por uma.

Ao longo do tempo, obviamente eles foram se atrapalhando e tropeçando nos conceitos, seus cérebros em geral mais habituados a questões práticas foram entrando em colapso com questões emocionais, e a confusão geral que se estabeleceu todo mundo conhece.

Mas aonde eu quero chegar com tudo isso? Bem, hoje eu acho que as coisas estão mais claras, e os homens com as cabeças mais pensantes e mais arejadas (que são os que interessam, os atrasados que corram pra longe) parecem gostar mesmo é das mulheres atrevidas, ousadas, prontas para a experimentação e compartilhamento de experiências. Naturalmente entrei aqui no âmbito sexual, era aqui que eu queria chegar, depois dos preâmbulos devidos.

E então as que ficaram lá nos anos cinquenta, as que são pudicas, usam calcinha da vovó, são envergonhadas, estão cheias dessa história, tiveram maridos ou que tais incompetentes, desistiram, mudaram de time, estão ocupadas para tanto, seja por motivos profissionais, porque são mães extremadas ou simplesmente não estão a fim - essas todas são cobradas. Não que se importem, muitas não estão nem tomando conhecimento, mas outras ainda sentem o peso e querem se livrar dele. E o motivo aqui, eu diria, não é para satisfazer ninguém a não ser elas mesmas.

Isso tudo considerado, as que estavam atrasadas no quesito, quando bem orientadas e abordadas, acabam se interessando, gostando, querendo saber mais, experimentar mais, se jogar mesmo. Daí se informam, fazem cursos que até Deus duvida, morrem de rir nas conversas, deixam de lado inibição, limites, etc., enfim, vão ser felizes. E daí apresentam a nova e reformulada mulher ao interessado.

E daí o interessado sai correndo pra casinha.

Afinal acho que não entendemos nada, acabamos pendurando pedaços de carne no açougue.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

I just keep walking



"Mas o meu silêncio foi maior...

Eu vou indo. Eu sigo apesar de ir me chocando, esbarrando em presenciar telefonemas outros, sinais que gritam em neon, o esfacelamento do que eu queria inteiro, vozes outras, palavras que não são minhas e palavras que eu queria que fossem minhas e são espalhadas aos quatro ventos. Eu vou caminhando no gelo fino, na areia movediça, no pântano, vou entrando na água para depois perceber que não dá pé. Tudo dói, as pontas vão me ferindo, mas mesmo sangrando eu ainda insisto. Já tentei justificar os porquês, já tentei me convencer, em vão, não há nada racional que justifique.

E ainda assim, tem sido aprendizado, a duras penas, mas não consigo dizer se é válido ou não. Porque dizemos coisas que não fazemos, fazemos coisas que dizemos mas não deveríamos contar que fizemos, e ficamos esperando que tudo se resolva, como se fosse assim fácil, como se programássemos a vida para amanhã, semana que vem, daqui a um ano. E ainda assim, eu vou indo. Algo dentro de mim me mantém andando. Até quando, não sei. O que vem depois, não quero saber. Já tenho o bastante de dor por ora, o viver em sobressalto, na espera sempre, ocupando-me em não ver, em não esperar, em não pedir, em não viver.



... e na distância morro todo dia sem você saber."

terça-feira, 31 de maio de 2011


Os últimos dias vêm sendo insanos, e então me ocorre, todos os meus dias são insanos, de uma maneira ou de outra, eu vou pulando de uma insanidade a outra sem trégua. As nuances é que vão mudando, e a atual vem me consumindo, como todas as outras, como é, como é para mim sempre, pela mania de querer extrair da experiência até a última gota, passando pela dor. Mas o momento agora é de desabrochar. É um momento esperado de superação, de um passo dado. Futuro não há. Para ninguém. Que venha o momento então. E que a intensidade renove meu sangue para as próximas insanidades.

sábado, 21 de maio de 2011

Eu não quero. Na verdade eu queria estar a quilômetros, quilômetros de distância, em um lugar que muito provavelmente está preenchido. Mas eu vou, de coração em pedaços e a garganta tão fechada que eu nem consigo engolir. Mas eu vou, porque eu me devo isso.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Turning points



Em determinadas vidas, a uma determinada altura, a mudança se faz fundamental, não só recomendável, mas assim, vital, mesmo. Eu já tive dois pontos em minha vida onde era mudar ou morrer, e sinto que se aproxima o terceiro.

Todo mundo sabe que todo pai e mãe faz o que considera o melhor para a prole, ainda que não tenha a menor ideia de como fazer isso. O que resulta em geral é que o melhor que foi feito em grande parte não é o melhor que a prole gostaria. E acabamos vivendo a vida não como escolhemos, mas como escolheram para nós. Obviamente há honrosas e numerosas exceções, e tanta gente cedo percebe que o que se disse que era o certo não o é, e melhor ainda, que o certo não existe.

Porém o que acontece com não menor frequência é que aquilo que engolimos como certo acaba sendo o mais fácil, o mais cômodo, o que dá menos trabalho, e estabelecemos a famosa zona de conforto, e para não sair dela colecionamos desculpas - devia ter feito isso quando era jovem, tenho minhas responsabilidades, meus filhos são pequenos ainda (e repetimos o erro), dá muito trabalho, é impossível - enfim, a lista vai longe. E vamos vivendo nossa vida entre almofadas, e elas vão ficando tão fofas que acabam um dia nos sufocando.

E esses são os turning points. Não que eles necessariamente acontecem, na maior parte dos casos eles não acontecem, por isso os hospícios andam lotados, a indústria farmacêutica fica cada vez mais poderosa e os psiquiatras cada vez mais ricos. Porém, em algumas vidas e nessas eu me incluo, não há opção. Repito, é mudar ou morrer - literalmente ou não, porque já estive zumbi - morta em vida. O que me assusta é que estou atingindo um ponto em que sabe-se lá até onde vai a literalidade.

Essas epifanias tomam um tempo para se desenvolverem em atitudes. Eu já sei que chegou outra encruzilhada. O que fazer com isso ainda preciso determinar. Engraçado é que são processos que podem ser os mais diversos. Na primeira vez decidi e pronto, é isso que tenho que fazer, talvez a ideia viesse amadurecendo há anos, mas fui lá e fiz. Na segunda precisei comer o famoso pão que o diabo amassou pra deixar de ser teimosa, e cheguei bem perto da literalidade. Como vai ser agora? Não sei. Já recebi uma sugestão de simplesmente fechar os olhos e pular. É uma boa sugestão. Só preciso achar o precipício do qual quero dar o salto, e tem que ser um bem diferente dos que eu frequentei até agora, porque até hoje só caminhei na beira, olhei para baixo e me afastei de volta para onde estavam as almofadas.

Porém, quanto mais eu vivo menos em me conformo com o suficiente, com o normal, o comum. A minha fome se multiplica. Os abismos vão ficando cada vez mais fundos. E quanto mais fundos maior a vertigem, e maior a vontade de finalmente sentir a sensação de ir caindo, caindo, caindo.

domingo, 15 de maio de 2011

Conto de fadas


Era uma vez um príncipe que vivia em um reino distante, muito distante, independente do ponto de referência. O príncipe era muito bonitinho e gostosinho, mas como todo nobre que se preza, ele tinha problemas existenciais. Ele já tinha tido princesas, algumas duraram muito, outras nem esquentaram a coroa, mas ele teve uma em especial que ele cismou que era a que devia usar a coroa. Acontece que essa princesa específica por um tempo até usou a coroa, mas por algum motivo não lhe caía bem, e ela um dia montou em um cavalo no meio da madrugada e caiu no mundo para nunca mais voltar. A única coisa que ela deixou foi um pé de um par de sapatos que ela derrubou acidentalmente ao arrumar a bagagem na calada da noite. Claro que isso deu um toque de Cinderela à história, mas já que estamos falando de realeza, que seja.

O príncipe obviamente ficou arrasado, tentou encontrar a princesa que fazia seu coração pular, mandou mensageiros, mercenários, uma pena não ter GPS naquela época. Mas nada dela aparecer, porque quando uma princesa não quer, não importa o que o príncipe faça, ela não vai ser achada. O príncipe chorava dia e noite inconsolável e mirando o sapato, já pensando em procurar a dona do pé que se encaixava nele.

E assim fez. Experimentou o sapato em várias donzelas do reino, em outras tantas não tão donzelas, e até nos reinos vizinhos, mas nada da princesa, que a uma altura dessas nem lembrava mais do príncipe e não sentia a menor falta da coroa que incomodava a cabeça dela.

Um dia em suas andanças o príncipe encontrou uma princesa que estava ela mesma se recuperando da fuga de um príncipe. Ele pediu a ela se poderia experimentar o sapato, ela consentiu, afinal não tinha nada a perder. E obviamente o sapato não serviu (mesmo porque o pé da princesa anterior era enorme e feio, e o desta não era). O problema é que o príncipe sabia que estava sendo um pouco imbecil em ir encaixando o sapato em pés alheios, porque não era cego e viu que aquela não era a princesa que ele buscava.

Mesmo assim, essa princesa nova andava cheia daquelas paragens que andavam monótonas, e ele convidou-a para morar no seu reino, mas dentro de algumas condições. Ela poderia viver lá, usufruir da companhia dele, privar de sua sala de jantar e outros aposentos reais, mas não poderia receber o título de princesa, porque esse título era da dona de seu coração, ou quem sabe de alguma outra cujo pé encaixasse no sapato.

A princesa gostou do acordo, o príncipe tinha bom papo, sabia cozinhar, gostava de passear pelo reino e sabia fazer outras coisas que ela pediu que não fossem reveladas. Porém, parte do acordo era que haveria um muro entre os aposentos reais e o aposento da princesa, e esse muro era intransponível, somente o príncipe podia passar para o lado da princesa, mas não o oposto.

Por um tempo então o acordo funcionou, mas o chato era que o príncipe vivia falando da princesa perdida ou de uma eventual outra princesa cujo pé coubesse no sapato. Ele gostava da compahia dela, ela não sabia cozinhar mas sabia outras coisas, e era uma boa companheira em suas andanças pelo reino e para assistir as justas de cavaleiros. Mas ela não era A princesa. E ele fazia questão de deixar isso muito claro para ela com mais frequência que o necessário.

A princesa que não era boba um dia acabou se cansando dessa história. Como os cavaleiros do reino e príncipes de reinos distantes andavam procurando um espaço no muro, ela um belo dia, ao tropeçar no famoso sapato da dita cuja, se encheu e jogou o referido na cabeça do príncipe, e partiu para outras paragens, porque ninguém merece alguém que vive agarrado a um sapato velho ou a um pé que não existe.

Fim da história. Aos bons entendedores que seja feita justiça.

quarta-feira, 11 de maio de 2011



Eu honestamente tinha perdido o entusiasmo. É tanta consideração, preocupação, elucubração, problemas reais e imaginários, as asperezas em geral foram minando minha alegria, que já não era lá tão entusiasta porque eu sempre pensei demais nela e a dissequei, deixando poucos ossos no processo.

O que mais me doeu foi ter perdido o "rapture", aquilo que me deixava sem fôlego. Isso não recuperei, mas ganhei em troca outra coisa que me mantém respirando, apesar da respiração ser entrecortada, e por ora já está bastando. E eis que sinto nova infusão de oxigênio, um pouco menos de medo, um pouco mais de vontade, de ousadia, de disposição para continuar caminhando.

Talvez a maturidade traga serenidade, o que não significa que roube os olhos arregalados e o coração disparado de sempre. Acho que esta noite vai ter fogos de artifício.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Primaveras


Estes últimos tempos têm sido cheios de perguntas, as respostas realmente não sei, as denominações continuam pendentes, ou seja, eu não sabia nada e agora nada sei. Ainda assim, apesar de tudo, são bons tempos. Quem sabe um dia as respostas aparecem, ou mudamos as perguntas.
Parabéns. Que a vida sorria para você, que eu esteja por perto pra gargalhar junto.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Sleeping Beauty



O fato de que contos de fada vão muito além das versões que conhecemos e que há todo um aspecto psicológico em torno deles é bem conhecido. Eu adoraria discorrer sobre isso se soubesse pelo menos o suficiente para não falar bobagem, mas só sei mesmo o óbvio.

Outro fato é que meu sono sempre foi bom mas nunca muito fácil, e hoje em dia eu simplesmente caio dormindo sem nem me dar conta, no avião, no carro, no sofá (coisa de velha), à frente do computador me vejo segurando a cabeça, na cadeira do aeroporto, a televisão, então, virou um sonífero. Eu não durmo pouco durante a noite, acordo cedo mas raramente durmo tarde, não tenho nenhum distúrbio físico que pudesse me causar sono, a única ocasião em que isso me assaltou foi quando estive depressiva, e depressão é como alcoolismo - um dia de cada vez. Assim, tomo o devido cuidado, mas eu sei que o sono de depressão é aquele que a gente procura, e agora quem me persegue é ele, e não o contrário. E é implacável, porque não consigo fugir de modo algum.

Aí hoje me deparei com o desenho aí de cima, que achei lindo, e sem ter a menor pretensão de ser a beleza que dorme, me identifiquei de outra maneira. Sem entrar em detalhes do que não sei, é possível que o sono da bela seja na verdade aquilo de nós que ainda dorme. E eu sei o que dorme em mim. Mas não consigo soltá-la. E a porta nunca esteve mais escancarada, presa não está, só encolhida no canto.

Eu ouvi recentemente de alguém que me conhece melhor que eu mesma que eu não sei sonhar. Fiquei estupefata, mas tive que concordar. Até o meu sono é um sono sem sonhos. E não era desses sonhos que estávamos falando. Era o daydream, eu não faço isso. E até consegui identificar porquê. Eu disse que nao sonhava porque quando o que eu queria não se realizasse doeria muito. Meu medo me impede de querer. É o que doi menos. Então - eu ouvi - fique com sua pouca dor e também com a angústia de não sonhar.

Isso tudo ficou armazenado, e vendo através da janela a Aurora dormindo, veio tudo à tona e eu obviamente me debulhei em lágrimas, que é o que eu faço quando o meu copo transborda. Eu choro de tristeza, eu choro de frustração, eu choro porque sinto adagas no meu coração, mas acima de tudo choro por esse motivo mesmo - não consigo sonhar. Eu estou muito, muito perto. As coisas ainda me assustam tanto. Mas aquela voz lá no meio dos espinhos que cercam o castelo sussurra para mim que é assim, a maldição foi lançada, o dedo foi espetado no fuso, o sono é necessário, mas a maldição não é tão má como parece, a fada a transformou... Mas cadê a paciência pra esperar cem anos???

Então meu sono é agitado, entrecortado de sobressaltos, a expressão serena de Aurora é puro photoshop, passar cem anos na posição que ela ficou não vai ser possível. E eu fico me perguntando, como? como se sonha? Alguém sabe me dizer onde fica esse botão que aciona o modo "sonhar"? E onde se desliga o botão de "medo de sonhar"??? Parece que vai ficando mais claro porque eu ando caindo pelas tabelas, talvez quem sabe uma noite de sonhos dormindo inspire um dia de sonhos acordada. Ou uma noite de sonho, ponto. E então a mesma pessoa me diz quando eu peço a solução - é só fechar os olhos e pular.

domingo, 1 de maio de 2011



Ainda me falta tanto, meu Deus. Quando eu penso que estou entrando no caminho onde a dor é menor, eu olho em volta e vejo a mesma paisagem, o mesmo disco se repete na minha cabeça, as mesmas palavras saem da minha boca, a mesma tristeza invade o meu coração, a raiva ainda mora em um lugar tão familiar, o meio de mim sente os mesmos golpes, as mesmas punhaladas, on, and on and on, e vou ainda semeando lá fora o que me incomoda tanto aqui dentro, criando mais do mesmo, por que, por que é tão difícil sonhar, ignorar o medo de uma dor maior, que pode afinal nem vir, para que as garantias que em última análise sabemos que não valem nada, por que eu guardo a inteligência na gaveta quando mais preciso dela, por que ainda mantenho o barco ancorado quando o meu desejo é me fazer ao mar, por que eu calo quando há tanto a dizer...

Não tenho as respostas, mas sigo perguntando, eu sei que um dia vou acordar pela manhã e assim, out of nothing, elas vão cair em cima de mim.

sexta-feira, 29 de abril de 2011



Eu ando sobre o gelo fino. Entre o respeito e a quebra definitiva das cercas, entre a mão que se estende no ar e para antes de tocar e as pernas que agarram como tesouras. Eu faço e desfaço as malas, eu me obrigo a fazer o que não quero e quero o que não me obrigo a fazer. Eu fico entre o não e o por favor que grita, em silêncio, por trás do muro, da fachada, da casa que é a fortaleza. Eu procuro as asas perdidas, porque sei que elas estão lá, apenas recolhidas, eu tenho o remédio, mas o caldeirão ainda destila o passado, o presente assustador, o medo. Sim, eu estou aqui cansada, e não sei mais se espero, e não sei mais em que condições estão as minhas defesas. Fico entre o reino da covardia e a mansidão, e a invasão, a derrubada das paliçadas, os cavalos que saem em disparada, as espadas, gritos e clamor, o calor da batalha, o ardor do fogo que incendeia fora, dentro, casa, castelo, muros, cercas, cabeça, coração.

terça-feira, 26 de abril de 2011



Eu estive fora uns dias, de novo. Mas desta vez não voltei querendo matar ninguém que não more dentro de mim mesma. Sair da realidade diária nos transporta para um mundo paralelo onde somos visitantes, e essa dualidade de moradias, a temporária e a permanente, cria perspectivas inesperadas.

Desta vez aprendi tanto e meu coração ficou tão quentinho que nada tenho a reclamar, eu diria até que revogo reclamações anteriores, apesar de saber que logo elas vêem de novo.

Sem entrar no mérito da definição do que é real ou não, eu diria que consegui me esconder da realidade a maior parte do tempo. Ela em vários momentos arreganhou os dentes e estendeu suas garras, mas eu solenemente a ignorei e ela acabou se conformando em esperar meu tempo de voltar ao seu lugar de origem. É bom se esconder da realidade? Não sei, porque não sei o que ela é. Qual é a realidade real?

Eu aprendi muito de mim e dos outros, eu vi e senti coisas que mexeram em meu coração, eu ri, eu chorei, e sempre transbordando, porque essa é a única realidade que é deveras real para mim - eu transbordo.

Eu entrei sem perceber em momentos que nunca mais vão sair de mim, não importa o que aconteça, eles serão meus para sempre, e ninguém pode roubá-los de mim, por mais ladrões de momentos que me espreitem armados de mágoa, de fúria, de descontrole. Nem o futuro terá esse poder.

O mundo ficou surreal por uns dias. E me deu fôlego novo. Todos sabem que a melhor vingança é ser feliz. Eu de minha parte já achei compensador o surreal. Mesmo porque, repito, não sei se aquele era o su-real. Os artistas, lunáticos e insanos vivem em suas próprias realidades. Artista não sou, o resto não sei, tenho os meus momentos. Apesar que o meu real convencional é que parece o mais insano de todos. Mas aí vou ter que entrar na discussão do que realmente é loucura e o que não é, e então não teria fim.

O fato é que eu não esperava, mas voltei mais madura, mais flexível, com os olhos mais abertos, escancarados na verdade, cheguei já passando a espada na realidade que me esperava gritando, esperneando, exigindo seu posto. Vamos ver quem cria a realidade mais plausível. E para quem.

Enquanto isso, eu vou sentindo o sabor doce. Doce não sei de quê, mas doce.

sexta-feira, 8 de abril de 2011



A vida tem sido cheia de arestas lancinantes, e eu me questiono se tem que ser assim, e se vai sempre ser assim. Eu passei tanto tempo anestesiada e sem viver e tudo era tão cinza por dentro que eu achei que sentimento pior que aquele não existia. Então ressuscitei e a volta à vida trouxe em alguns momentos dias mais coloridos, mas a vida é tão aguda que dói mais ainda que o campo árido que eu fui por tanto tempo. Ou seja, estou sempre querendo correr para fora de mim, para um outro lugar onde não seja nem o deserto e nem a profusão tão grande de flores que dói a vista e os insetos picam.

Mas onde fica esse paraíso do meio termo? Ele existe? Eu tenho que viver tudo tão intensamente até doer? Como eu faço para parar antes que chegue nesse ponto?

Aliás falando em pontos, eu tive momentos tão pontuais em minha trajetória que poderia até precisar o dia e a hora em que alguns sentimentos se manifestaram. E isso é muito esquisito. Hoje eu me apaixonei. Antes de ontem comecei a desistir de alguém. Amanhã vou acordar e não sentir mais o que me ceifa hoje. Já que é assim, eu deveria agonizar menos, eu poderia ter mais equilíbrio.

E voilà - o equilíbrio. Eu sou uma pessoa externamente muito equilibrada, eu sou uma cidadã exemplar, pago meus impostos, dirijo com cuidado, tenho uma profissão honesta, minhas dívidas são só as razoáveis, eu tenho uma aparência de respeitável. Mas agora vou confessar uma coisa que vai jogar a minha reputação pelo ralo, eu não sei quem é essa. Quando alguém me diz o quanto eu sou tranquila e responsável, eu gostaria de convidar para passar uns três dias dentro da minha cabeça. Esse lugar se parece com uma obra de Dali, lá é tudo surreal, eu produzo coisas dentro de mim que dariam um tratado de esquisitice. Eu sou a manjada imagem do lago plácido onde mora o monstro.

E eu estou cansada, muito cansada. Eu insisto no que não deveria, eu entro em situações que eu sei que não vão acabar bem, eu digo sim para aquilo que grita não lá no fundo, eu ignoro o que é anunciado em neon e efeitos sonoros, eu me machuco pondo a mão no fogo sabendo que queima. Mas eu insisto, eu acredito no papai noel, na cegonha e na paz mundial. E o pior de tudo - sou totalmente ciente da insanidade total que é viver como eu vivo. Só não sei onde está a porta de saída.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Escolhas e de como não pô-las em prática



Eu ando entre os píncaros da ilusão e o duro do chão quando caio novamente. Eu vivo entre a racionalização do que eu sinto e do que o outro parece sentir e o desvario de sentir que nada é o que parece e eu nao quero o que é. Eu fui avisada, eu já ouvi, eu já sei o quanto dói. Inclusive alguma coisa já parece que se quebrou. E no entanto a força para levantar e sair é hercúlea, e me falta fôlego. Eu sei onde é a porta, e ela está aberta. Mas o doce da paisagem na janela não me deixa sair do lugar. E assim, fico entre a paisagem linda mas inalcançável e a porta que poderia me levar a outras paisagens mais belas, e que está mais perto, mais acessível, é só levantar e sair. Mas.

quinta-feira, 31 de março de 2011



Ao ver isto acabei me lembrando de um tempo em que eu não tinha medo.
E me dei conta que essa pessoa sem medo ainda vive dentro de mim, um tanto afogada nas águas revoltas, mas está lá em algum lugar. Acho que ela dá conta.
Bring it on.

terça-feira, 29 de março de 2011

Dores



Eu me diagnostiquei com tristeza crônica. Observe-se que eu sou uma pessoa de opções, e estou sempre escolhendo as erradas. Se não restassem alternativas eu poderia usar essa desculpa. Mas há, e muitas. De cara, a mais óbvia seria a totalmente oposta da escolha que eu estou fazendo.

Acontece que eu não sou óbvia. E não ser óbvia dói no fundo da alma, dói por todos os lados, é um desespero de querer sair de dentro de mim porque dói tanto que parece insuportável. E é uma dor que transborda porque de tão grande não cabe. E transbordando, ultrapassa a alma e vira dor física. Então eu estou doendo toda, por dentro e por fora.

E no entanto não consigo viver de outra maneira. Teimosia? Eu gostaria de poder chamar de persistência. Eu gostaria de muitas coisas. Uma delas é que eu queria realmente sair do quadradinho onde aprendi na infância a viver. Por muito tempo alardeei que não vivia no certinho, mas na hora da dor, isso grita na minha cara - você quer o certinho. Mas não quero querer. E então dói. E então não acaba mais.

Daí aprendi a ficar com o que dói menos no momento. O que não deveria, porque todos merecemos tudo, não as migalhas. Mas quem determina o que é tudo, menos que tudo, pouco ou migalhas? Por quanto tempo? Em que condições? São tantas variáveis que fico tonta. Mas continua doendo.

E então no meio do caos existem frestinhas de delicadeza que vão me sustentando em pé. As delicadezas que vêm de amigos, de família, as delicadezas disfarçadas. E a fonte da dor que por total incompetência e por sua própria dor - porque todos as temos e elas irradiam e machucam o outro - deixa por uns momentos entrever... o que? Não sei. Mas sei que isso não acrescenta à minha dor.

Lágrimas não tenho. Talvez elas não queiram sair porque só se dignam a fazer isso com motivos contundentes. Sorrisos também não tenho. Não sei quando vou voltar a tê-los. Por ora, não sei é de nada.

quinta-feira, 24 de março de 2011



Por muito tempo eu quis e muitas vezes consegui conviver com pessoas por assim dizer, "complicadas", em oposição a "simples", porque se alguém me diz que é uma pessoa muito simples achando que isso é uma vantagem, perde de cara milhares de pontos. A simplicidade que se alardeia como qualidade é na verdade uma preguiça de ser alguma coisa, é ir sendo levado pela correnteza, é não tomar conhecimento de nada porque dá trabalho, é passar pela vida.

Por outro lado isso de querer saber demais é um fator complicante por si só, muitas vezes me questionei se não seria melhor ficar mesmo sendo a sonsa, a dondoca, a mediana, ou a alienada total, chegando aos extremos. Só que não tem volta. Adquirir mais conhecimento é sempre possível, des-saber não dá. E aí fica difícil conviver com o raso, o superficial, o mais ou menos. Então tendo a procurar o que não é fácil.

E acabo achando, é claro. Achei muitas pessoas complexas que me acrescentaram muito ao longo dos últimos anos, que foi quando saí do limbo e voltei a procurar, mas de todas as criaturas intrincadas que consegui trazer para o meu convívio hoje posso dizer que me superei.

Eu poderia querer algo simples, conversa fácil, programas previsíveis, questionamentos relacionados a que cor de carro eu compro, aonde vamos, as últimas notícias. Mas não. Eu peço a confusão, a dificuldade, o multíplice. E ele vem, e traz todas as facetas dolorosas com ele.

Todos temos a fachada, aquilo que queremos mostrar. Na maior parte do tempo funciona. Mas algumas vezes o que deveria ficar adormecido pula para fora. E quanto mais se conhece alguém mais coisas pulam. Em geral grandes homens com cara de mau e que transpiram confiança, coragem e decisão escondem um menino que tem problemas com a mamãe (qual não tem?) mas que quer ser grande. E então constrói um muro tão, mas tão alto, e se esconde atrás dele, e chora, porque na verdade busca o não-muro, mas parece doer tanto a exposição que toda confiança aparente não é suficiente para abrir nem uma frestinha.

Não há frestas, não há portas, só há nãos, não posso, não consigo, não quero, não vou. Eu sou, eu faço, eu aconteço - e queria muito acreditar nisso. Eu sou forte, decidido, resolvido - e poderia mesmo ser se não lutasse tanto contra. As fortalezas que construímos e disfarçamos de segurança acabam assustando mais ainda a criança que não sai de dentro de nós, só mudamos de tamanho.

Isso tudo é obviamente muito difícil de administrar para quem está perto, mas eu não consigo viver de outra maneira. Não há meio copo, meu copo só transborda. Não tem mais ou menos, não tem pode ser, vamos ver. Eu sou uma derrubadora de muros. Às vezes sutil como uma infiltração de água, às vezes contundente como um trator. Mas não sobrará pedra sobre pedra.