terça-feira, 20 de dezembro de 2011

As paralelas podem se cruzar no infinito


A gente pede tanta coisa. Alguns pedem aos seus deuses, outros a nem sabem quem, outros ao Universo, mas não importa, a gente está sempre pedindo. E já se sabe que é preciso cuidado com o que se pede. Mas me ocorreu que quando pedimos, escolhemos. São tantos os caminhos, quando finalmente aquele que queríamos se abre, muitos outros ficam para trás. Alguns com desmoronamentos que vão bloqueá-los para sempre, esses em geral são penosos, cai pedra por pedra em cima da gente, e sair deles dói muito.

Outros, porém, não são assim. Simplesmente eles ficam lá. São os caminhos suaves que deixamos para trás, as outras opções das nossas escolhas que não foram as eleitas - ou as que a vida não quis nos dar. Ontem eu deixei para trás um caminho suave. É tão emocionante poder falar sem subterfúgio, ter ouvidos abertos e compreensivos, é tão bom poder se mostrar sem medo. Eu estou partindo para o meu novo caminho, mas esse outro foi tão suave e tão florido que eu achei que até passaria por ele mais uma vez antes de tomar o outro. Não passei. Mas passei ao largo e foi ainda melhor. E ainda tive duas surpresas, uma que as palavras não ditas em muito tempo acabaram saindo, e outra - vejam só - apesar de eu achar que esse caminho não dava em lugar nenhum, ficou claro que avenidas poderiam se abrir. Mas tem a vida, né? Esse caminho deixei para trás florido, aberto e ensolarado. Foi uma sensação maravilhosa de humanidade.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011


Hoje o mundo acordou contra mim. Há dias em que no meio da tarde a gente conclui que não deveria ter saído da cama, pra começar. E não são acontecimentos aleatórios relacionados a Murphy, não. Esses não me pegam porque eu os ignoro.

Eu me pergunto como é que eu ainda não fui banida da sociedade civilizada. Sim, porque existem regras. E grande parte delas eu cumpro, trabalho honestamente, pago meus impostos, não cometi nenhum crime, só consumo drogas lícitas e sou razoavelmente aceitável socialmente. Só que tem as outras regras. As sub-reptícias (amo essa palavra, mas ela me parece uma cobra pronta para dar o bote) são as que estão me cutucando.

Quando eu era bem mais jovem, muitas dessas entraram na minha cabeça por osmose, e eu demorei tanto para perceber que elas não eram minhas que passei por muito sofrimento que poderia ter sido evitado. Hoje eu sei quais são as minhas e quais das dos outros eu posso acatar para ter menos trabalho - sim, porque há batalhas que também não quero mais lutar, tenho mais o que fazer.

E então, eu vou seguindo a minha vida razoavelmente aceitável socialmente quando de repente resolvo tomar uma decisão. Ocorre que ninguém me pergunta se eu vou bem, se preciso de auxílio para pagar as contas, se preciso de alguém para me abanar enquanto como uvas (sim, parece que é isso que eu faço), enfim, enquanto eu estou comportada dentro dos parâmetros aceitáveis (estabelecidos por quem mesmo? aceitáveis para quem mesmo?) tudo vai muito bem e eu sou uma boa cidadã, boa mãe, boa filha, boa amiga, enfim, um primor. Mas aí a decisão. Como assim? Então de repente a total falta de interesse vira uma enxurrada de palpites, dedos apontados, julgamentos, pré-conceitos (assim mesmo separado, pra mim faz mais sentido), e perguntas que começam com "mas e se" "mas e como", "mas por que" "mas para que". Essas são as que eu ouço. Porque existe o burburinho silencioso que grita tão alto apesar de não ter som.

Ocorre que para chegar até aqui muito me custou. Sangue, suor, lágrimas, arrastar de correntes e ranger de dentes. E - surpresa - nós somos sozinhos. Nossas dores são nossas, só nossas. Nascemos sozinhos, vamos morrer sozinhos e passamos a vida sozinhos, porque dentro da cabeça, só nós mesmos. As pessoas que mais nos amam são as que mais nos magoam, as que mais se sentem no direito de decidir o que é melhor para nós, e em geral nossa vontade não conta. E se não for conveniente para o bem-estar geral da nação, fazem até questão de torcer contra.

Junte-se a isso uma tendência suicida que eu tenho de auto-sabotagem. As palavras vão saindo da minha boca e eu sei que elas deviam ficar lá dentro mas não deixo. No meio da frase já estou arrependida, mas ainda assim termino. Não sei se consigo acabar com isso antes que isso acabe comigo. Nota-se, portanto, que de inimigos não preciso, pois os que me amam me criticam e minha maior adversária sou eu mesma.

Portanto, eu me outorgo o direito de decidir o que eu quiser,  atinja a quem atingir, doa a quem doer, incomode a quem incomodar. Não vai ser a uma altura dessas que eu vou querer começar a ser boazinha. E depois a gente não sabe porque um dia acorda, se olha no espelho e se sente a pessoa mais amarga do planeta.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Homero, Achilles e o que se passa pela minha cabeça

Eu ando me atracando com a Ilíada e como todo o resto das coisas na minha vida, tem sido intenso.

Não sei como se pode ter dúvida de que uma pessoa só escreveu a história toda, eu diria que seria simplesmente impossível ser uma colcha de retalhos de bardos como alguns defendem. Eu duvidaria que foi um ser humano que escreveu, se já não tivesse lido tantas coisas tão brilhantes quanto escritas por outros humanos (quem sabe abduzidos).

A riqueza de detalhes e a absoluta necessidade de descrever a descendência pelo menos parcial de quem está no meio da batalha com o escudo na mão ou a lança de bronze no flanco é o que me espanta. Naturalmente poderíamos discutir aqui o aspecto de análise literária, o kleos, a busca da notoriedade que demanda saber a origem e a prioridade máxima da vida o reconhecimento. Tanto que Achilles opta pela vida curta e gloriosa ao invés da chatice aos pés de Peleu. Mas não vou me alongar porque não quero analisar nada literariamenter, só quero acrescentar algumas bobagens que me passam pela cabeça.

Primeiro que só tenho tempo para ler antes de dormir e agora que cheguei na parte em que Achilles parou de bobeira e entrou na luta, eu participo da batalha a noite toda e já sei que não está custando nada para começar a fazer associações eróticas com o Achilles. Mas isso é outra história, o que é fascinante é como existem pessoas que não gostam de ler, não sabem o que é livro de verdade, os ácaros que têm dentro do cérebro têm alergia aos livros.

Obviamente a uma altura dessas da vida e tendo a formação que tive já li livros até demais. Mas a cada um é um entusiasmo que chega a ser fisicamente manifestável. As epopéias (não, não vou abolir o acento) então, são coisas tão grandiosas que é impossível não entrar nelas. Eu estou do lado dos aqueus, provavelmente pela minha quase obsessão pelo Achilles, mas o Páris me intriga. Ele é a causa de toda a confusão e em vez de lutar vai ficar com a Helena que foi pra isso mesmo que ele arrumou toda a encrenca. Eu admiro a cara de pau dele, o anti-herói que -"couldn't care less".

Não resisti a ler alguns materiais a respeito, principalmente em relação à participação dos deuses, o Olimpo não poderia ser uma baderna maior, e eu queria saber como seria se nós não tivéssemos caído no monoteísmo, como seria atualmente lidar com deuses com características mais que humanas, teimosos, rebeldes, e podendo fazer o que querem? Eu me divirto muito fazendo associações de pessoas que conheço aos deuses mais diversos, afinal o propósito todo do arquétipo é esse - encaixar alguma coisa ou alguém nele.

Homero se existiu foi brilhante. Se não existiu também foi. Aprendi a não discutir o que funciona. Foi assim que achei meu Achilles, adaptado. E com calcanhar também.