sexta-feira, 17 de maio de 2013

Maldição



Amaldiçoados são os brilhantes. Cérebros que vão além são centros de tortura que se espalha como dardos pelo corpo todo. Quem conhece sofre. Quem busca encontra e lamenta. Poetas malditos, artistas que cortam as orelhas, os pulsos, põem para dentro de si o veneno que esperam que alivie ou preencha as fendas, os precipícios, os buracos negros de quem sabe. A inteligência corre no sangue transportando dor, angústia, desespero. Para que saber mais? Para que pensar mais? Para que questionar o inquestionável, por que pegar a mala e sair para o mundo? Ver o que? Ler o que? Pôr o que dentro de nós, por que não aceitar que o que é, é, e não poderia ser, talvez fosse, deveria ser, precisa ser, um dia pode vir a ser. Os que nascem sob o signo do horizonte largo recebem a maldição de nunca ter sossego, vampiros, demônios, lobisomens, metáforas dos que não conseguem dominar nem fugir do que têm dentro de si. Os que são postos na fogueira, pregados na cruz, apedrejados em praça pública, submetidos à tortura, têm a reputação arruinada, são postos nos manicômios, à margem, os eremitas. Condenados a procurar, buscar, a saga do querer saber mais, se apropriar da História, da vida, do mundo. Anjos caídos.

Abençoadas as ovelhas. Os básicos, os que não lêem, não perseguem o complicado, os que assistem novela e dançam freneticamente músicas sem sentido, os que não buscam nada além das 24 horas do dia. Os que simplesmente são, assim, intransitivamente são. Não há perguntas, e as respostas entram e saem em fluxo dinâmico, pouco se retém, o suficiente. As refeições do dia. O dia de trabalho que finda no horário marcado. O trabalho como meio de sustento não de crescimento. Crescer para onde? Para que? Por que? Nascer, Reproduzir, Morrer. Existem, não duvidam da existência. A vida cabe em uma sacolinha pequena, não há bagagem pesada para arrastar pelas ruas amarguradas de quem carrega malas e malas de conhecimento acumulado. Comer é para ficar vivo, as alegrias simples são as mais genuínas, o sofrimento imenso às vezes não é nem compreendido, passa, não arranca pedaços. Amanhã é outro dia. Ou não, tanto faz. Donos do céu.

Vou arrastando minhas malas sem esperança de simplesmente observar a paisagem, é assim para quem entra nesse caminho sem volta.

2 comentários:

Silvana Ferrari disse...

Perfeito, Laine. E mais não digo. Amei.

Regina disse...

Querida amiga, que texto brilhante! Como te entendo! Como me identifico! É isso mesmo. Também arrasto minha bagagem.