quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
Perdas e ganhos
Ontem eu perdi a minha avó para a vida. Não foi para a morte, não, foi para a vida mesmo. Todas as perdas são irreparáveis, porque cada pessoa é única. Perder uma avó dá a sensação de que vamos ficando com as costas descobertas, a vida vai impondo seu ciclo. Eu respeito muito aqueles que perdem pessoas ao contrário do ciclo, os que perdem filhos, especialmente, na minha opinião têm desculpa para tudo. As avós nós no fundo sabemos que vão antes de nós. A minha já andava mesmo cansada. Ninguém queria que ela se fosse, obviamente, mas a vida foi tão longa e sofrida, de todas as maneiras, que o coração literalmente se cansou de bater. O que a manteve esse tempo todo talvez tenha sido as alegrias que ela produziu nos outros.
Essas perdas nos acordam para a finitude. Eu acordei para algumas outras coisas. Como sempre tenho vivido no olho do furacão, lá onde eu mesma gosto de me pôr, e é uma escolha. Mas o drama, o arrastar de correntes, a tristeza, a raiva - esses não são boas escolhas.
Eu estou profundamente triste. Mas o sol nasceu logo cedo. A gente põe a tristeza na caixinha dela, levanta da cama e vai trabalhar, socializar, consolar quem precisa mais, amar quem amamos, deixar de lado o que é afinal de contas tão desimportante, conhecer aquilo que o mundo está nos oferecendo para ver. As caixinhas servem para alguma coisa, afinal. Elas só precisam ficar nos lugares certos enquanto vivemos. Temos sempre coleções de dores que talvez devessem ficar cada uma em sua caixinha, nas condições adequadas de conservação. Com o tempo, algumas caixinhas vão sendo esquecidas, outras abrimos às vezes, algumas ficam perdidas para sempre, sem que a gente saiba para onde podem ter ido.
Eu me senti estranhamente calma e em paz. Essas ocasiões normalmente soltavam a maluca histérica que morava em mim. Não sei por onde ela anda, os últimos dias foram de uma tranquilidade ímpar, que eu já senti algumas vezes e depois caí de novo no redemoinho, aos poucos. São as epifanias. E as coisas tomam sua real dimensão - o que é importante marca presença, o que não é nem merece consideração, não por mágoa ou por fuga, naturalmente se esgota.
De tudo isso advém aquela vontade enorme de experimentar. Tudo. Porque a mesma vida que cumpre seu ciclo encaminhando para longe de nós aqueles que já têm um caminho diferente a seguir, nos oferece os nossos próprios caminhos, nossas possibilidades que são tantas, o chão para nos apoiar, as mãos que seguram as nossas, as palavras amigas que acrescentam e se fazem presentes - na alegria e na tristeza. A minha tristeza está na caixinha, a caixinha ainda está aberta. Mas à minha frente abre-se o mundo inteiro de possibilidades, e com o bônus do aprendizado bem aproveitado.
A vida apesar de tirar de nós coisas tão importantes, ainda nos oferece tanto que é impossível mesmo não continuar. E até que chegue a hora dela nos tirar de alguém, que possamos tirar dela o máximo daquilo que ela nos oferece. A minha escolha hoje é essa.
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