sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Carta de alguém para alguém, com nenhum assunto em particular


*Essa carta é a do filme "Letters to Juliet", um filme para pensar no que fazemos com as nossas oportunidades.

"Um dos meus piores desafetos é o Gregório, que quis impor uma contagem de tempo ridícula que não faz nenhum sentido e deve ter contribuído para os descaminhos que a humanidade percorreu por falta de orientação das estrelas. Mas uma coisa que aprendi nestes últimos dias é que preciso de alguma maneira viver em sociedade, e portanto, adaptar-me a algumas regras básicas como o calendário, por exemplo. Sendo assim, mais uma vez nesta semana fiz o que não gostaria, mas diferente das outras ocasiões, esta não me desagrada. Passaram-se doze meses desde o dia em que te vi pela primeira vez. E daí? E daí mesmo, mas já que eu acabei me lembrando, no meio do vórtice em que caí nestes últimos dias, quis te contar, por nenhuma razão mesmo.
Já discuti comigo mesma milhões de vezes a história do copo cheio e do copo vazio, e estou plenamente ciente de estar olhando pelo lado errado, e como parte do aprendizado de aquisição de novos olhos, que fiquem registradas algumas coisas, antes que elas passem, antes que alguém as tome de mim, antes que elas virem outras coisas, porque a transitoriedade é a única garantia.
Pouco sei dizer porque acabo na choradeira, as ideias se organizam melhor no papel, pouco faço, pouca coragem tenho, pouco vivo. E vivia menos ainda, e nem sabia o que existia além. Já discutimos que às vezes a ignorância é melhor, nos poupa de dores maiores, mas uma vez que temos conhecimento do que existe, uma prova de gosto de mundo, existem dois caminhos. Um é fingir que não se viu, e continuar no modo zumbi até morrer, o outro é provar mais do que nos agradou. Esse último é o caminho perigoso, cheio de armadilhas, e onde eu finalmente me vi sozinha nestes dias, sozinha de uma solidão atávica, aquela em que não adianta companhia, não adianta ninguém dizer estou com você, aquela que deve ser a mesma que sentimos quando nascemos, e quando morrermos, é a solidão intrínseca, aquela dos que crescem e arregalam os olhos no escuro tentando saber o que aconteceu. Mas uma vez escolhido o caminho, as pontes são queimadas atrás de nós, as montanhas se erguem do nada, e a única opção é seguir em frente. E me parece sempre que o caminho vai ficando cada vez mais estreito, mais frio e mais inóspito.
Mas existem as paradas no caminho, os oásis, em algum desses encontrei você, que vinha também no seu caminho inóspito – mas lembre-se, as pontes queimaram – assim como todo mundo, apesar de parecer que só a nossa dor dói, a dor do outro também é dolorida.
E agora acabaram-se as minhas metáforas, eu viajo tanto nelas que se continuar vai parecer Alice no país das maravilhas, o que não deixa de ser uma boa referência de insanidade necessária. Você tem sido um apoio necessário que eu não sabia que precisava, ou sempre precisei mas não tive nunca, só arremedos, projetos, falta de vontade. Eu não vou me repetir, os elogios eu consigo manifestar, outros poderia tentar, mas acaba soando vazio. Eu poderia te dizer isso tudo a qualquer momento, então vou aproveitar este senão fico esperando o momento se manifestar e – de novo – as coisas mudam, acabam, ficam mutantes com tentáculos, e eu deixei passar. Independentemente dos momentos de dor, que não foram raros, isso deve ser dito, e dos outros, de confusão, de dúvida, do sentimento de impotência diante de tantas verdades, que afinal, não são absolutas, como nenhuma é, apesar de tudo e por tudo, foi um ano mais intenso que dez anos outros do resto que eu vivi, foram dias preenchidos, seja com dor ou com alegria, mas no balanço final aprendi muito, o que já é um resultado positivo. E antes que eu me esqueça, que as coisas mudem ou que eu morra, queria que você soubesse disso. Por nada, não, só para seu conhecimento mesmo."

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